segunda-feira, 31 de maio de 2010

Competir e concorrer

Numa época em que se defende a necessidade de aumentar a produtividade e a competitividade da nossa economia em âmbito de globalização, vale a pena meditar no texto a seguir transcrito e na NOTA que se adita:

Regionalizar Portugal
Jornal de Notícias. 31-05-2010. Por Carlos Abreu Amorim

1. Portugal (a par com a Grécia) é o país mais centralizado da Europa. As decisões administrativas e políticas que há muito foram transferidas para entidades locais e regionais nos países que têm sucesso, por cá fazem ainda parte do descomunal acervo de atribuições e competências que empanturra o Governo. Portugal é um país, indecorosamente macrocéfalo e desigual. A discrepância no progresso das suas regiões é o reflexo mais nítido da obstipação centralista que impede a visão de Portugal como o todo uno que deveria ser.

Num país onde quase tudo deriva do Estado, é indubitável a relação directa entre os nossos fraquíssimos índices de desenvolvimento económico, social, cultural e político, e a obsessiva centralização que nos entreva.

2. O Norte perde riqueza e população, desbarata a sua massa crítica, arruína as oportunidades e os sonhos das suas gerações mais novas, extravia a sua identidade e amor-próprio ao ver-se forçado a mendigar junto do poder central os refugos daquilo a que tem direito. Apesar de ser a região mais exportadora do país e a que tem melhor saldo na balança comercial, é no Norte que o desemprego mais aumenta e o investimento mais diminui - documentos oficiais demonstram que 58,6% do investimento feito nos projectos PIN estão no Sul do país, sendo que os projectos PIN do concelho de Grândola excedem em quatro vezes o que foi realizado em todo o Norte… Os fundos comunitários têm contribuído para o acentuar deste desequilíbrio: os dois primeiros quadros comunitários de apoio patentearam um subfinanciamento crónico do Norte, sendo que o actual, infelizmente, não deverá primar pela diferença.

Há uma 'Lei de Bronze do Investimento Público': os Estados que perfilham militantemente a 'Tradição do Mau Governo', como o nosso, dão sempre prioridade ao investimento nas suas redondezas territoriais em detrimento das zonas que são mais remotas do lugar onde reside o poder de decisão.

Portugal é o exemplo acabado desse modelo antigo cujo falhanço, em todo o lado, forçou a transferência dos poderes centrais para entidades mais próximas dos cidadãos sobre quem vai recair a decisão pública.

3. Um grupo de cidadãos que não se conforma com este lamentável estado de coisas está empenhado em fazer um partido regional do Norte. O seu desígnio é lutar politicamente para mudar Portugal e forçar a descentralização regional. Como de costume, levantaram-se inúmeros obstáculos. Garantem os centralistas que a Constituição não o consente, que a crise actual não o tolera e que há reformas mais urgentes.

É no mínimo estranho que os centralistas citem a Constituição para contrariar o cumprimento de um princípio que a própria Constituição prevê desde 1976 e que nunca foi executado: a regionalização.

Embora não esteja seguro que um novo partido político seja o instrumento ideal, não há reforma que faça mais sentido - sobretudo neste momento de crise. A reforma regional da nossa Administração tornou-se num imperativo sem possibilidade de recuo, a reforma das reformas o 'sine qua non' do desenvolvimento - ao contrário, a sua falta é a grande explicação para a nossa presente penúria.

A regionalização foi em toda a parte o caminho para diminuir o peso do Estado e de o tornar mais eficiente. Todos os países do primeiro mundo fizeram da regionalização a receita para aumentar a riqueza, o incentivo para a criação de oportunidades nas zonas mais desoladas, a hipótese de fixação de população mais jovem no interior e, principalmente, a fórmula que sedimentou a participação cidadã e fez medrar a ideia da liberdade.

A liberdade só está completa no seu sentido de cidadania quando as pessoas sentem que ela possui significado concreto nas decisões que conformam as suas vidas. Se o poder é distante e alheado, os cidadãos ausentam-se da política e desinteressam-se da sua própria liberdade.

Pois, como ensinava Alexis de Tocqueville, o sentimento da liberdade não se despeja de cima para baixo - a liberdade ou é sentida na dimensão local (e regional) ou não tem alicerces para sobreviver a nível geral.

NOTA: Talvez esta seja a solução para uma competição e concorrência interna entre as regiões que acorde as pessoas e as tire do marasmo que tudo permite e aceita. É preciso acabar com o unanimismo amorfo que se verificou na aprovação da lei do financiamento dos partidos e na votação por unanimidade em congresso do PSD da lei da rolha de que todos, a seguir, se confessaram arrependidos. É este Portugal que precisa de ser mudado urgentemente, através do despertar de energias que têm andado escondidas e transformado as pessoas em ovelhas cegamente obedientes a pastores oportunistas movidos por interesses egoístas.

2 comentários:

Luis disse...

Caro João,
Com a Regionalização o governo central e seus asseclas perdem poder e nisso "eles" são exímios em não ceder...
Um abraço amigo.

A. João Soares disse...

Caro Luís,

É sempre o mesmo problema, desde há muito tempo, os políticos esquecem a sua função e não colocam os interesses nacionais acima de tudo o resto. Pensam acima de tudo em satisfazer a sua vaidade a ambição de riqueza, a vida faustosa à conta do orçamento e mendigam um encontro lá fora com o Chico Buarque...

Portanto não podemos esperar mudanças por iniciativa dos políticos. Terá de ser o povoa pressioná-los, a ameaçá-los para eles se sentirem obrigados a fazer reformas convenientes. Mas o povo, por enquanto comporta-se como um rebanho de ovelhas obedientes como os deputados que votaram por unanimidade a «Lei do financiamento dos Partidos» e os grandes do PSD que votaram por unanimidade a «lei da rolha».

Maus prenúncios para a geração dos nossos netos!!!

Um abraço
João
Saúde e Alimentação