sexta-feira, 25 de junho de 2010

A crise está a começar, disse Jacques Attali

Recebido por e-mail do amigo M C Braz, que recebeu da jornalista Maria João Carvalho

Entrevista de Laura Davidescu para a Euronews

Podemos prever as crises económicas? É um exercício perigoso a que Jacques Attali se dedica há muitos anos. Engenheiro e economista de formação, presidiu ao Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento nos anos 90. Jacques Attali é autor de numerosos ensaios sobre política, economia e finanças.
A Euronews entrevista-o sobre a crise grega e as turbulências na Zona Euro. Para começar, Jacques Attali lamenta o atraso da Cimeira Europeia no tratamento do tema.

Jacques Attali - A cimeira ocorre muito tarde ... se tinha sido feita há 15 dias, três semanas, teríamos colocado 40 mil milhões na mesa e teria sido suficiente. Mas não foi, hesitámos, dissemos que não o faríamos, por isso é a pior das soluções, dizer não e depois dizer que sim.
Em segundo lugar, o mecanismo que está em vigor não é credível, os montantes anunciados são muito elevados, mas o plano de rigor imposto aos gregos é absolutamente insustentável e mais: nós nem sequer lhes pedimos poupanças no orçamento da Defesa, o que representa a maior parte dos gastos!
Assim, os mercados vão forçosamente colocar a questão de saber o que se vai passar com outros países, estão preocupados, e vão tentar compreender se os Estados vão ser sérios, em Portugal, em Espanha, em Itália, em Inglaterra, porque o Reino Unido também está mal colocado.
E assim vamos ter mais ataques, não propriamente ataques, verificação da seriedade dos Estados que não o são.
Hoje em dia, os governos europeus não tomam a única decisão que se impõe, ou seja, criar títulos do Tesouro europeus para emprestar em nome da Europa. Tudo o que fazemos hoje é esbanjar.

Laura Davidescu, euronews - Então diz - se é que estou a compreender - face a uma crise com tal amplitude a única solução é consolidar os mecanismos verdadeiramente europeus?

J. A. - Claro, (...) a única solução é a de crescimento para a redução da dívida , é a única solução.
Mas enquanto se espera a retoma do crescimento, enquanto se fazem as economias necessárias, é preciso evitar a catástrofe e para evitar a catástrofe, devemos emprestar de modo credível e o único que pode emprestar de modo credível é a União Europeia.

L.D. - Mas está longe de ser uma decisão dessa envergadura ...

J.A. - Nestes dois anos, de qualquer modo, não fizemos nada.
Parecemos o G20, que não serviu para nada, anunciámos tanto que nunca cumprimos, temos tanto medo de tomar a mais pequena decisão que não fizemos nada enquanto a bolha crescia.
A crise era uma pequena crise dos subprimes americanos, que devia ter custado 10 mil milhões de dólares e se tornou numa crise mundial de bancos que pode custar 500 mil milhões de dólares ... continuamos a não fazer nada, salvo transferir para os contribuintes, o que se transformou em crise da dívida pública que atinge os 7,8 biliões de dólares.
Os bancos continuam a especular exactamente como antes, os actos imorais também continuam do mesmo modo, nada, absolutamente nada mudou num sistema que está totalmente nas mãos do mercado financeiro internacional.

L.D. - Foi então que descobrimos, depois de uma crise das finanças privadas a crise das finanças públicas....

J.A. - Não descobrimos . Se me permite, com muitos outros, há três anos que digo que não fazemos mais do que transferir a dívida privada para a dívida pública.
Desde o momento em que se deu a crise do Lehman, escolhemos transferir a dívida privada para a dívida pública, e como aceitámos transferir aceitámos financiar todas as perdas dos mais diversos bancos e, Lehman à parte, não deixar ninguém declarar falência.
Assim, aceitámos que o contribuinte de amanhã, para além das dívidas que tenha, pague esses erros.

L.D. - Um dos motivos, já que há tantos, das queixas dos últimos três meses, está ligada ao Fundo Monetário Internacional.
Os dirigentes alemães opuseram-se a que a Europa pague, e assumem sozinhos o plano de socorro à Grécia.
O senhor qualifica, num artigo recente, a decisão de finalmente apelar ao FMI, como desonrada. Porquê?

J.A. - Retomei a fórmula de Churchill: "Você hesitou entre a guerra e a desonra, e porque escolheu desonrar-se vai ter a guerra. "
Infelizmente, esta fórmula que apliquei é verdadeira. Escolhemos a desonra porque o Fundo Monetário é uma estrutura honorável mas não é uma estrutura europeia. Assim, confiámos a outros, ou seja, aos americanos e outros não europeus a responsabilidade de decidir a política que convém seguir num país europeu.
Assim, optamos por uma estratégia que está a destruir a identidade europeia.
E o encargo principal será europeu, pois são os europeus que vão pagar a crise.

L.D. - Mas e se isso não chegar a acontecer, precisamente por a nossa construção europeia ter defeitos, pecados originais? Por exemplo, o euro nunca foi apoiado por uma política europeia comum ou fiscal ou económica ou de qualquer modo. Então, será que podemos enfrentar?

J.A. - Há 10 anos que digo que o euro vai desaparecer se não formos capazes de estabelecer um orçamento europeu.
Sempre avançámos assim na Europa: fizemos o mercado único porque o mercado comum não era suficiente e de cada vez houve crises que precederam estes factos.
Hoje, vemos como uma evidência que a moeda única não pode existir sem uma política fiscal e orçamental. Não é possível.
Então, será que temos a coragem de o fazer? Vamos ver! Mas, por agora estamos a lidar com os políticos que são do século XX. Estão um século atrasados.

L.D. - Há um, entre os actuais líderes da Europa, que mostre sinais de ter entendido esta realidade?

J.A. - Infelizmente, o único político sério que parece sério e ter compreendido é Jean Claude Trichet, mas não é um homem político.
É o único na Europa, que conheço, talvez com Jean Claude Junker também, que na posição de patrão do eurogrupo viu bem o que estava em jogo. Ambos compreenderam que era precisa uma integração maior, mas eles não estão em posição de impor.

L.D. - Então para onde acha que vamos, Sr. Jacques Attali?
J.A. - Acho que estamos a ir para pior, e pior é dizer entre dois a três anos, até menos, uma desintegração da Europa. A única questão é se os políticos que tiveram a coragem de decidir na calma podem fazê-lo durante a tempestade.

L.D. - Na tempestade? Então é apenas o começo desta tempestade ...

J.A. - Com certeza, a crise está apenas a começar. Todos os que têm vindo a dizer, há meses e meses, "a crise acabou, saímos da crise" dizem qualquer coisa. A crise está apenas a começar. Porque o público aumenta a dívida, porque a recessão está aqui. É claro que não há crise na China, Índia, Ásia e em outros lugares. Mas a crise na Europa, a crise nos Estados Unidos, a crise no Japão, a crise em todos os países da OCDE está à vista. Estes velhos países, antes ricos, estão cansados, optaram por viver no crédito mas é preciso pagá-lo.

L.D. - Que preço tem de pagar a Europa? É que assim vai sair, se sair, mais fragilizada do que nunca.

J.A. - Primeiro ainda não acabou. E esta pode mesmo ser a ocasião, como quando houve a crise da desvalorização de 92-93 , ou a grande crise da Europa nos anos 83- 84, pode ser o momento de se reforçar, de fazer com que a crise se torne a ocasião para fazer melhor e mais. Ainda espero que a Europa compreenda que hoje a única via que lhe resta é Mais Europa e não Menos Europa.

L.D. - Na 24 ª hora ...

J.A. - Esperemos que não seja na 25a, para citar um grande escritor romeno.

L.D. - Portugal? Existe um risco, imediatamente ou nos meses que vêm? E Espanha?

J.A. - Sim, evidentemente, os mercados vão verificar se os políticos que não fizeram a tempo o seu trabalho sobre a Grécia, vão fazer o seu trabalho sobre Portugal. Assim, vamos ver as notações de crédito (credit default swap ) de Portugal, de Espanha e do Reino Unido aumentarem até ficarem sem crédito, e vamos ver o que fazem os governos.

L.D. - O pior cenário.

J.A. - O pior cenário. É por lá, sem dúvida, que é preciso passar para chegar ao despertar da classe política.

Maria João Carvalho, Jornalista da EuroNews
http://rotativas3.blogspot.com/

Imagem da Internet

9 comentários:

Zé Povinho disse...

A dívida pública, que em larga medida existe para cobrir a dívida privada, dos bancos nacionais e das grandes empresas também, vai ter que ser paga. O que ainda não ouvi da boca dos que nos (des)governam foi o mea culpa pelas asneiras cometidas, nem tão pouco a admissão de que as políticas seguidas estavam erradas. Assim não vamos lá.
Abraço do Zé

RAMIRO LOPES ANDRADE disse...

CARO A. JOAO SOARES


PORTUGAL ESTA NO BURACO, MUITO PELO CASO DO BPN.
SÃO MAIS DE 9 MIL MILHÕES DE EUROS DE ROUBO NO BPN.
DIAS LOUREIRO , CAVACO SILVA , E MUITOS OUTROS QUE ESTÃO ENVOLVIDOS, MAS O POVINHO GOSTA MESMO É DE FUTEBOL.
QUERO VER É DEPOIS DO MUNDIAL, AI É QUE VÃO SER ELAS ................

UM ABRAÇO.

RAMIRO ANDRADE - O PROVOCADOR

A. João Soares disse...

Caro Zé Povinho,

Os políticos, principalmente os governantes, consideram-se infalíveis, ou pelo menos tentam convencer disso o povo. São incapazes de aceitar que erraram e que vão emendar. Quando fazem algo desse género é porque sofreram grandes pressões da população

A notícia Primeiro-ministro: “A tarefa de um político é dar uma palavra de confiança” , mostra a intenção de iludir o povo com mais mentiras para lhe criar falsas esperanças. Em vez de acções e de medidas concretas e correctas, que iriam inspirar confiança, jogam com palavras ocas, promessas falsas para iludir o pagode.
Fazem de nós estúpidos e usam as manhas de vendedores da banha da cobra.
A incompetência é geral e não conseguem merecer a nossa confiança porque demonstram ser um bando formado pela escória da sociedade, chico-espertos, deslumbrados que se candidataram e conseguiram iludir o povo e sacar-lhe o voto. Isto passa-se com os de todos os partidos que, desde há décadas, vêem afundando o País.
Os nossos netos terão de pagar as dívidas que os pais e avós lhes deixam em herança.

Um abraço
João

A. João Soares disse...

Caro Ramiro,

Concordo com a sua opinião acerca do BPN. Mas convém irmos mais fundo, às causas e circunstâncias em que isso foi possível acontecer. Isso pode voltar a dar-se, se entretanto não forem eliminados as condições em que Portugal funciona. Há um numeroso conjunto de vigaristas que agem descontroladamente à margem da lei, imune e impunemente. Veja o que aqui consta em posts recentes sobre o amiguismo. Usam o património de Portugal para seu benefício e dos amigos, com a única finalidade de se tornarem o mais ricos possíveis à custa daquilo que é de todos os portugueses. É uma situação de saque, por qualquer meio.
As chamadas privatizações com «golden shares» e fundações são covis de «boys» e asilos de políticos em fim de vida, onde ganham milhões. Por falar de bancos esteja atento ao que tem sido publicado sobre o BdP, BCP, BPN, BPP e até a CGD.

Não é fácil limpar Portugal. Seria necessário um fortíssimo raticida, pesticida, insecticida ou a bomba atómica.

Um abraço
João

Táxi Pluvioso disse...

Podem-se prever depois de sucederem. Aí até Medina Carreira salta a terreiro com sabedoria. Antes, duvido que se preveja seja o que for. bfds

A. João Soares disse...

Caro Táxi Pluvioso,

Nada acontece repentinamente. A própria trovoada é prevista com antecedência. Um bom especialista estando atendo aos sinais e que não seja optimista sonhador pode prever uma crise. Cavaco Silva disse que previu esta já em 2003 e que escrevei vários textos sobre isso. Até comprou acções do grupo do BPN e as vendeu antes do colapso.
Os especuladores prevêem as subidas e descidas da bolsa.
Portanto, é possível prever e, sem dúvida, é possível evitar atropelos, truques e falcatruas que ofendam a sensatez, a lei, a ética. O problema é que os donos do dinheiro e os políticos são cúmplices, trocam favores e, daí, os tachos para velhos reformados que já pouco produzem mas que têm a seu crédito os favores que fizeram quando estiveram no poder.
Para evitar isso, os políticos fizeram uma lei condicionadora mas ela não refere um órgão responsável pelo controlo e julgamento dos infractores. A lei foi para dar a ilusão de moralidade, inexistente.

Um abraço
João

Mentiroso disse...

Atenção, que isto não mais fez do que agravar a crise nacional, a qual pela sua gravidade própria só se aprofundou um pouco mais. Foi o golpe de misericórdia.

Ninguém em Portugal parece compreender até que ponto é grave, pois que já vem de longe como a fama do Constantino e os corruptos e ladrões das associações de malfeitores mafiosos políticos têm encoberto para não matarem a sua galinha dos ovos de ouro.

Sempre foi tão evidente. O que é realmente de estranhar é que pensem que a descobriram e que fiquem agora tão admirados. Só mostra a incapacidade que até agora tiveram, a qual não se pode acreditar ter desaparecido tão rapidamente. Por isso não se pode acreditar que tenham aberto os olhos de um dia para o outro: ou sempre mentiram ou continuam incapazes como antes.

Papagaios!

A. João Soares disse...

Caro Mentiroso,

Já se notam sinais positivos que mostram que nos partidos já está a haver conhecimento da realidade. As mudanças só são rápidas com um golpe. Sem ele, ocorrerão progressivamente, exigindo firmeza e persistência, o que não é fácil devido à resistência dos mal intencionados, os donos da galinha dos ovos de oiro.
O povo tem que acordar e ser o fiscal do comportamento dos políticos. O caso das Scuts é uma prova da força do povo. É preciso não esmorecer e exercitar todos os músculos que possam contribuir para um futuro melhor.

Um abraço
João

Luis disse...

Amigos,
Na Tulha está um artigo em que um experiente economista chinês esclarece esta crise na Europa e no Mundo! Parece-me um artigo a exigir muita reflexão!
Um abraço amigo.