A notícia «Sócrates tem esperança na recuperação económica com base no investimento público», publicada com outros títulos noutros jornais, embora não seja promessa nem anúncio de um projecto ou programa, presta-se a reflexões que devem ser profundas, imparciais, isentas e sérias.
No post «pensar antes de decidir» era apresentado um método de preparação das decisões em que procurava mostrar-se que estas, principalmente quando se traduzem em condicionamentos do futuro de pessoas e de nações, devem ser realistas, isentas e de ideias bem largas e esclarecidas, com vista multilateral dos factores e condicionantes em campo. Não devem ser tomadas por capricho, crença ou fé, nem por pressões de grandes empresários ávidos logicamente de defender os seus interesses, nem por vontade de aceitar opiniões de amigos dedicados (yes men) que querem agradar ao chefe e não o contrariar nos seus juízos e preconceitos.
O mundo está a precisar de decisões de repercussões muito significativas, havendo que definir bem o problema, o objectivo pretendido e os seus condicionantes, bem como a linha estratégica que conduz á concretização desse objectivo. Depois, deve existir um controlo cuidadoso e rigoroso por forma a garantir a convergência dos esforços, para não haver desperdício de energias e se atingir o melhor resultado.
Muitas vezes o que parece não é. No livro «THE COMMANDING HEIGHTS» dos autores premiados Daniel Yergin e Joseph Stanislaw, Edit. «A Touchstone Book», de 474 pág, apresenta logo a partir da pág 69 a análise do problema do desenvolvimento da Índia, então em vias de obter a independência, em que o Mahatma Gandhi defendia a instalação de teares artesanais nas aldeias a fim de, ao comprarem tecidos do seu próprio algodão, não terem de pagar o transporte deste para a Grã-Bretanha, o fabrico e o posterior transporte do tecido para a Índia. Porém a proposta do Pandita Hehru venceu ao defender uma indústria ligeira para substituir as importações e incentivar o desenvolvimento para consumo interno e, depois de vencida esta primeira etapa, irem para uma indústria pesada orientada para exportação. O resultado foi bem visível poucos anos mais tarde.
Um outro exemplo da importância das decisões de Estado, que arrastam c0nsequências para milhões de pessoas por muitos anos, por vezes, durante séculos é o que constitui o tema essencial do livro «SISTER REVOLUTIONS French Lightning, American Light» de Susan Dunn, editora Faber and Faber, Inc. que compara a génese e a conduta das duas revoluções Americana e Francesa, occorridas quase em simultâneo.
As grandes diferenças nos resultados destas duas devem-se, em grande parte, às origens e bases doutrinárias usadas por uma e por outra. Um dos aspectos foi que o fracasso da revolução francesa (que levou ao terror jacobino e finalmente à tirania e à guerra do Napoleão) se deveu ao postulado inicial, utópico e lunático, de "liberté, egalité, fraternité". Com efeito, os conceitos de liberdade e igualdade são incompatíveis! Tal como veio a ser demonstrado muito mais tarde pela experiência soviética, e de certo modo com o nosso PREC, pós-Abril.
Pelo contrário, o ideal da revolução americana "We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal, that they are endowed by their Creator with certain unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the pursuit of Happiness" (conceito que vem do filósofo escocês Hume) põe a liberdade em destaque mas não impõe qualquer ideia de igualdade como objectivo final da sociedade. Cabe a cada indivíduo fazer o que muito bem entender com a sua vida, o seu livre-arbítrio, a sua característica genética, e não compete ao Estado constrangi-lo ou impor-lhe a sua ideia de felicidade, limitando-se apenas a garantir que cada um não prejudique os legítimos direitos dos outros cidadãos. É preciso respeitar a desigualdade e proporcionar que os desiguais convivam em ambiente de respeito, civismo e segurança.
Em Portugal, após o 25 de Abril, a liberdade foi entendida como libertinagem e logo aí em vez da apregoada igualdade surgiram exclusões e discriminações que restringiram a liberdade de cada um poder ser ele próprio e procurar a sua felicidade. À semelhança do fracasso da revolução francesa, e da URSS, também por cá houve fracasso de que ainda hoje nos lastimamos e não se vê a porta de saída deste labirinto em que se procura conciliar o inconciliável.
Isto faz temer que o sonho, a crença, a convicção do PM possa arrastar as gerações futuras para uma vida de desgraça, de dívida externa insolúvel. Parece que não será o investimento público, só por si, que irá produzir para substituir as importações a que os portugueses estão habituados, nem para exportar em quantidade que compense o volume de importações, a fim de equilibrar a «balança de pagamentos» e eliminar a dívida pública. Não parece ser com tais investimentos que se cria mais bem-estar para os portugueses de hoje e do futuro. Eles trarão benefícios apenas aos construtores e a indivíduos especializados em tráfico de influências e a decisores do género dos referidos a propósito dos casos «Facturas Falsas», «Apito Dourado», «Freeport», BPN, BPP, «Portucale» «Face Oculta», etc.
A. João Soares, 26-12-2009
sábado, 26 de dezembro de 2009
Sócrates «encrençado» no grande investimento público
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12 comentários:
Amigo João Soares,
Não tenho dúvidas que actualmente vivemos com os políticos mais foleiros desde que a democracia impera.
A culpa é nossa, embora eu não os tenha escolhido a maioria é que tem razão. Infelizmente não havia melhor para escolher, é um facto.
Os nosso filhos pagarão por tudo o que de mal estamos a gora a fazer.
Haja esperança.
Um abraço.
Caro amigo João, de facto, concordo com o comentador anterior e acrescento mais ainda, que é, este nosso país vive dos "Idolos" dos "Big Brother's" e de quaiquer realaty show que se lhe apresente, é a brejeirice em forma de governo, onde tricas entre Belém e São Bento são mais importantes que o estado actual do país.
Que dizer do sensassionalismo oportuno dos mídia em tudo isto?
Não vamos por caminhos melhores, porque não nos deixam e nós principalmente não o queremos fazer, e quandoi digo nós, falo da maioria que infelizmente está imbecilizada e se tronou num saco de pancada, como dizia o escritor.
Abraços e continuação de um bom fim de semana.
@Beezz
Carlos Rocha
Amigo José,
O grande mal de tudo isto, o maior crime, é que estamos a estragar a herança que devíamos legar aos nossos filhos e netos.
Tudo porque não sabem ou não querem pensar a sério no futuro do País tomam decisões impróprias, lesivas dos interesses nacionais e mantêm-nas teimosamente, apesar de alertas de gente bem conhecedora dos problemas, mas porque há interesses ocultos, como se tem visto em relação a outras sucatas de decisões.
E não se pode falar de maiorias, porque o partido do Governo tem apenas os votos de pouco na+mais de 20% dos cidadãos eleitores, inscritos nos cadernos eleitorais. Cerca de 80% não lhe deram o voto.
Um abraço,
João
Caro Carlos Rocha,
Infelizmente tenho de dar razão à forma como define a generalidade dos eleitores: imbecilizados feitos saco de pancada.
Ou vivem em coma induzido, aceitando tudo quanto lhes queiram injectar. Como autómatos irão a breve prazo meter o voto com a cruzinha onde os arautos do marketing lhes ordenar. Não sabem porquê nem para quê.
Um abraço
João
Eu acho que liberdade sem um mínimo de igualdade é que nem uma coisa nem outra funciona porque a liberdade excessiva duns atropelará os direitos mínimos dos outros. E temos o exemplo do Estado Novo em que se criou uma liberdade máxima duns em prejuízo dos direitos mínimos dos outros. E veja-se no que deu passados 48 anos de vigência.
E a situação em que estamos hoje é resultado do aumento constante das liberdades duns em prejuízo constante dos direitos mínimos dos outros, nos últimos 30 anos, sempre com a promessa de que tudo será em benefício dos prejudicados.
Não gosto de responder a anónimos que não deixam qualquer sinal de identificação. Nem sou filósofo para analisar profundamente estes conceitos.
Mas as afirmações do anónimo só podem ser de brincadeira. A igualdade só deve ser de oportunidades de cada um procurar a sua felicidade, isto é, a igualdade de todos perante a lei.
Nós agora temos a igualdade dos deputados que cumprem como ovelhas as ordens do partido e votam unanimemente as leis tal como o pastor manda.
A igualdade levou todos os deputados menos um a votar a escandalosa lei do financiamento dos partidos. Pergunto para que servem tantos deputados se em tais votações todos se resumem a um e os outros são fotocópia?
A liberdade impõe o respeito pelos direitos dos outros, pelas liberdades dos outros sejam pobres ou ricos, brancos ou de cor, nascidos aqui ou no estrangeiro, podendo seguir a profissão para que sentirem mais aptidão, escolhendo com quem casar, onde morar, o tipo de carro ou de bicicleta, ou sapatos, etc, etc. Se assim não for pode ser libertinagem ou outra qualquer coisa menos séria.
Essa anedota de no tempo do Estado Novo ter havido «uma liberdade máxima» só contaram para você!!!
Mas o texto refere liberdade e igualdade, para justificar a diferença entre a evolução da ex-colónia americana e a da grande potência da época, França. Já leu o livro Sister Revolutions? Em que discorda da tese da autora? Qual é a sua explicação de tal diferença? Se este seu comentário não se limita a uma estúpida brincadeira e provocação, certamente vai trazer-nos boas explicações. Cá as esperamos, mas tenha coragem de assinar o que disser. Não queira que todos os portugueses sejam iguais aos mais medrosos.
João Soares
Faça clic sobre as palavras seguintes e leia toda a notícia para alimentar o seu pensamento acerca deste tema:
“Em matéria de desemprego não deixou uma palavra forte de esperança para os mais de 500 desempregados que todos os dias têm a infelicidade de cair nessa chaga social”.
“Essa esperança devia ser, para todos os portugueses, que o governo começasse a governar, começasse a resolver os problemas prioritários que o país tem, começasse a criar condições para que as empresas tenham hipótese de manter e criar novo emprego, que é o principal desafio que em 2010 vamos ter”.
espera que o “governo também concretize o investimento público de proximidade, aquele que de imediato possa ajudar as pequenas e médias empresas a encontrarem trabalho”.
“É fundamental que o governo compreenda que tem hoje uma maioria relativa que obriga a que chegue a consensos com a Assembleia da República”.
esperar que o governo “concentre todas as suas energias e competências para fazer um Orçamento de Estado para 2010 com condições para ser viabilizado na Assembleia da República”.
o “primeiro factor de estabilidade vem e tem de vir do governo” já que “os portugueses votaram no Partido Socialista para que governasse nestas condições, ou seja, em maioria relativa e portanto tem necessidade de estabelecer pontes e consensos para que as suas propostas sejam viabilizadas na Assembleia da República”.
“Eu espero que o governo comece a governar e que comece por aquilo que deve, que é apresentar um Orçamento de Estado em condições de ser viabilizado na Assembleia da República”.
Cumprimentos
João
Amigo João Soares,
Fiz esta manhã, em http://letras-sem-tretas.blogspot.com, o meu modesto comentário ao discurso de Sócrates.
Não esperava outra coisa, senão uma palavrinhas a abater mas que não abatem nada porque o que ele deve ao povo português é muito mais do que Esperança e Solidariedade.
Li este seu texto com muito interesse, como aliás merecem todos os que edita. Concordo perfeitamente com o que diz, especialmente na parte final do mesmo... que poderia resolver todo um conjunto de "necessidades prementes" do povo português.
Um abraço.
Maria Letra
Querida Amiga Mizita,
Obrigado pela visita e pelas palavras simpáticas, como sempre.
Sobre o tema, os meus raciocínios modestos, as opiniões de gente que sabe muito de economia e de rentabilidade de investimentos, tenho muito receio que esta teimosia obsessiva no grande investimento seja uma asneira fatal para a sobrevivência do Estado. Os exemplos citados demonstram que é absolutamente necessário evitar caprichos, teimosias, ilusões, e cedências aos grandes empresários e aos corruptos, em vez de escolher uma solução adequada ao efeito que se pretende, ouvindo técnicos independentes ou mesmo da oposição. Os sucessivos recuos que o antigo ministro da saúde Correia de Campos teve de fazer deveram-se a decisões tomadas por capricho e mantidas por teimosia sob pressão de «yesmen», «boys» que não o aconselharam antes o empurraram para a realização daquilo que sabiam ser seu sonho. Por interesse de carreira, os assessores não gostam de contrariar os «patrões» e acabam por levar o País à desgraça. Receio que esta atitude de teimosia de Sócrates seja muito nefasta ao País, como teria sido o Aeroporto de Lisboa na OTA. É pena que ninguém da equipa governamental tenha serenidade suficiente para aprender com os erros já cometidos. A debilidade do País não aguenta tais aventuras e brincadeiras.
Desejo um Bom Ano de 2010
Beijos
João Soares
Caro João Soares:
Sem querer repetir observações muto acertadas da sua parte bem como de alguns dos comentadores, gostaria de sublinhar dois aspectos.
Primeiro, o do entendimento ambíguo da igualdade entre cidadãos que algumas correntes políticas cultivam, um mal que tem levado a desgraças diversas. Como foi dito, e muito bem, a igualdade deve aplicar-se às oportunidades que são dadas às pessoas e nunca a estas entre si, exactamente porque cada pessoa é diferente de todas as outras. O entendimento dos cidadãos como indivíduos de semelhante capacidade conduz, como a experiência tem demonstrado em inúmeras circunstâncias, ao nivelamento por baixo e à coarctação dos mais habilitados, com prejuízos para os menos e os mais habilitados. Percebe-se o temor e louva-se o cuidado de alguns que julgam poder a assunção das diferenças levar à escravidão dos subdotados. Mas, para contrariar tais temores, também se invoca o que a experiência tem mostrado, ou seja, que a via pela qual melhor se revelam e distribuem as potencialidades dos diversos indivíduos é a abertura generalizada de oportunidades, inclusive para alguns dos que, à partida, pareceriam incapazes.
Em segundo lugar desejo dizer que não vejo qualquer mal intrínseco no investimento público, antes pelo contrário. O problema, no nosso caso e neste momento, é dos governantes quererem investir à custa de um brutal sobre-endividamento do país e, ainda por cima, em algo polémico.
Há aqui um voluntarismo e esperança de retoma a curto prazo, pelo lado do nosso governo, que me parece raiar a loucura.
Um abraço.
Pedro Faria
Caro Amigo Pedro Faria,
Mais uma vez o seu comentário é brilhantíssimo, sendo um documento profundo e não um escrito ao correr da pena, como vulgarmente acontece.
A sua dissertação sobre o dicotomia igualdade/liberdade parece-me perfeita.
No entanto, quando se refere ao investimento público carece de analisar mais factores, além do problema do endividamento. Há vários exemplos de países que se desenvolveram sem muitas auto-estradas nem comboios rápidos, teimosamente construídos para negócios dos construtores «amigos».
Há que olhar para a necessidade e perante o estímulo ao desenvolvimento produtivo e às condições de vida da população. As pessoas devem ser sempre o fim último de qualquer decisão governamental.
Também é investimento público e mais prioritário do que o TGV criar ou melhorar as instalações da Justiça, as escolas, os hospitais, os lares para idosos, as condições de operacionalidade de bombeiros e polícias, de tratamento de lixos, águas, electricidade, portos e costas, matas do Estado, prevenção dos fogos florestais, etc.
Mas quanto a estes investimentos que são criativos de riqueza e de bem-estar, os governantes não sentem atracção, porque são disseminados e de pouca monta o que não traz os benefícios referidos nas operações FURAcÂO, FACE OCULTA, FREEPORT, etc, etc.
Não podemos ter ilusões. É preciso abrirmos os olhos. O homem é um ser imperfeito e parece que vão para a política os menos perfeitos. Errar é humano, mas seria bom que os políticos, nesse aspecto, não fossem tão humanos!!!
Um abraço
João
Meu caro João Soares:
Inteiramente de acordo. Com efeito, não desenvolvi a questão do investimento público. Apenas quis sublinhar o incontornável efeito sobre o nosso endividamento resultante do avanço do actual projecto de TGV que, sendo uma obra muito dispendiosa e de que não se vislumbrem contrapartidas claras a favor do país, acabará, muito provavelmente, por vir a pesar de uma maneira brutal sobre os nossos filhos e netos.
Um abraço.
Pedro Faria
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