Recebi por e-mail este texto do amigo Manuel Nicolau que constitui uma forma original de desejar Boas Festas dentro do «espírito de Natal» tendente à irmaNação de todos os habitantes do Planeta. Não resisto à tentação de o colocar aqui à apreciação dos visitantes irmanados.
irmaNaçãO
A morte recente do nosso Solnado Raúl no Campo de Honra, da vida do dia a dia, em que ao cinzento dos tempos, ao longo de dezenas de anos, contrapôs um gesto largo de humor e delicadas cores que nem sempre o Arco íris tinha na paleta.
E nós ríamos, às vezes já não tanto das piadas do Raúl, mas do embaraço do Arcoda Velha a revolver o fundo do baú, na vã procura de um tom, um cromatismo, uma nuancesinha com que se pudesse ilustrar aquela discreta e transbordante existência.
Era e é assim o humor do nosso Raúl, não cultivava a conclusão bombástica mas a insinuação drástica. Não o riso fácil mas o sorriso redundante, aquele do rir por gosto, o de conseguir levar a nossa conturbada consciência a exorcizar a azia e o enfado.
Quase trinta anos atrás cruzámo-nos em Carnide, no tempo do presidente Abecassis. A ideia já vinha de trás, criar um centro dia para artistas, na baixa da ribeira da Pontinha junto à antiga capela de S. Lourenço, paredes meias com as caravanas de ciganos e do circo.
A coisa fêz-se, com ele e tantos outros que não vou aqui nomear, não que o não mereçam mas porque hoje a conversa vai noutro sentido. O sentido quem o deu foi um companheiro de teatro do Raúl que após a sua morte nos vem contar que ele e o Varela Silva eram irmãos de leite.
Um dos dois que não recordo qual, em bebé perdeu a mãe e foi amamentado pela outra. Isto contado assim, desta maneira, primeiro é chato, confrangedor, depois cresce e no ver do Raúl faz deles irmãos, e aí sorrimos, depois ao lembrar os dois, faz-nos crescer à boca de cena.
Já são três: o primeiro, o segundo e o narrador. " Irmãos de leite". A expressão é tão antiga como a humanidade. Gerações de crianças se irmanaram com leite de amas, fossem elas escravas, servas, criadas, tias, primas ou irmãs mais velhas, ou avós. È coisa tão comum, que só dito pelo Raúl é reparo.
Este tipo de irmandade nunca constituiu direitos. A "irmandade pelo sangue" essa sim, constituiu direitos, linhagens e outros entrouches. E conflitos também, e muitos. Já no tocante aos irmãos de leite não tenho notícia de que alguma vez alguém tenha terçado armas por exigida prevalência.
Seja como for, o que é facto é que nos dias que correm acabaram escravas, aias, amas, servas e criadas, ninguém da família dá de mamar, mas por ironia do destino em 95% somos todos irmãos de leite. Não da teta mas da lata de leite condensado.
É verdade, com os excedentes da II guerra mundial os povos de todos os continentes passaram em algumas dezenas de anos a ser "irmãos de leite condensado". Menos protegidos do ponto de vista imunitário, vitaminas, perfil genético, mais viroses, mais gastrenterites, mas, vale a pena: mais fraternos.
Enfim há um longo caminho a seguir, mas quem sabe talvez este dado menor, seja uma contribuição maior para um almejado novo paradigma, de uma sociedade mais fraterna, mais solidária, sem exclusões, em que aqueles que tiverem a escassa oportunidade de mamar da teta da mãe não sejam excluídos por privilegiados.
Umas grandes festas para vós, um obrigado do tamanho do mundo ao Raúl, e pelo caminho não se esqueçam de cumprir aquele favorzinho que ele nos pedia. ...
E nós ríamos, às vezes já não tanto das piadas do Raúl, mas do embaraço do Arcoda Velha a revolver o fundo do baú, na vã procura de um tom, um cromatismo, uma nuancesinha com que se pudesse ilustrar aquela discreta e transbordante existência.
Era e é assim o humor do nosso Raúl, não cultivava a conclusão bombástica mas a insinuação drástica. Não o riso fácil mas o sorriso redundante, aquele do rir por gosto, o de conseguir levar a nossa conturbada consciência a exorcizar a azia e o enfado.
Quase trinta anos atrás cruzámo-nos em Carnide, no tempo do presidente Abecassis. A ideia já vinha de trás, criar um centro dia para artistas, na baixa da ribeira da Pontinha junto à antiga capela de S. Lourenço, paredes meias com as caravanas de ciganos e do circo.
A coisa fêz-se, com ele e tantos outros que não vou aqui nomear, não que o não mereçam mas porque hoje a conversa vai noutro sentido. O sentido quem o deu foi um companheiro de teatro do Raúl que após a sua morte nos vem contar que ele e o Varela Silva eram irmãos de leite.
Um dos dois que não recordo qual, em bebé perdeu a mãe e foi amamentado pela outra. Isto contado assim, desta maneira, primeiro é chato, confrangedor, depois cresce e no ver do Raúl faz deles irmãos, e aí sorrimos, depois ao lembrar os dois, faz-nos crescer à boca de cena.
Já são três: o primeiro, o segundo e o narrador. " Irmãos de leite". A expressão é tão antiga como a humanidade. Gerações de crianças se irmanaram com leite de amas, fossem elas escravas, servas, criadas, tias, primas ou irmãs mais velhas, ou avós. È coisa tão comum, que só dito pelo Raúl é reparo.
Este tipo de irmandade nunca constituiu direitos. A "irmandade pelo sangue" essa sim, constituiu direitos, linhagens e outros entrouches. E conflitos também, e muitos. Já no tocante aos irmãos de leite não tenho notícia de que alguma vez alguém tenha terçado armas por exigida prevalência.
Seja como for, o que é facto é que nos dias que correm acabaram escravas, aias, amas, servas e criadas, ninguém da família dá de mamar, mas por ironia do destino em 95% somos todos irmãos de leite. Não da teta mas da lata de leite condensado.
É verdade, com os excedentes da II guerra mundial os povos de todos os continentes passaram em algumas dezenas de anos a ser "irmãos de leite condensado". Menos protegidos do ponto de vista imunitário, vitaminas, perfil genético, mais viroses, mais gastrenterites, mas, vale a pena: mais fraternos.
Enfim há um longo caminho a seguir, mas quem sabe talvez este dado menor, seja uma contribuição maior para um almejado novo paradigma, de uma sociedade mais fraterna, mais solidária, sem exclusões, em que aqueles que tiverem a escassa oportunidade de mamar da teta da mãe não sejam excluídos por privilegiados.
Umas grandes festas para vós, um obrigado do tamanho do mundo ao Raúl, e pelo caminho não se esqueçam de cumprir aquele favorzinho que ele nos pedia. ...
Abraço
Nicolau
4 comentários:
Assim deveria ser, de facto.
Um bom ano para ti, João, Família.
Beijos.
Amigo João,
És um poço de surpresas... Descobres cada coisa, agora essa dos "irmãos do leite condensado" é de mais!
E como era dos excedentes da IIª Grande Guerra Mundial já devia estar estragado ... por isso a falta de paz que anda por aí!!!!
De qualquer forma um texto muito crítico e interessante.
Um forte abraço.
Querida Paula,
Agradeço a visita e as palavras simpáticas. Desejo uum óptimo 2010.
Beijos
João
Amigo Luís,
Não brinques com o prog+feessor Manuel Nicolau. Aquela cabeça vê muito bem. Do leite que bebeste beberam b+muitos outros meninos, seja ele Mimosa ou outra marca. Logo há uma irmaNaçãO de leite entre vós. Há muitos irmãos de leite. Logo Cristo, cujo nascimento agora se comemorou tinha razão em nos considerar irmãos, irmãos de leite!!!
É esse o espírito de Natal, sermos todos irmãos, embora sem direito a repartir a herança!!!
Um abraço
João
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