Guerra Junqueiro, há 113 anos escreveu:
"Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas;
um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai;
um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar."
Guerra Junqueiro, 1896.
Não houve evolução tecnológica que nos fizesse sair desta sina. O povo que é «quem mais ordena» não ordena nada e aceita o destino herdado, sem alterar o rumo da nau maldita.
A Decisão do TEDH (397)
Há 40 minutos
2 comentários:
Caríssimo João,
Que retrato mais fiel do nosso povo nestes últimos anos! Este é actualmente fatalista, ligado a um fado triste e de miséria! Até quando? Há que ressurgir das cinzas e dar novos mundos ao mundo! Ser FORTE mas para isso há que ser Culto, saber honrar o Trabalho, ter Princípios e ser Solidário!
Um grande abraço.
Caro Luís,
O primeiro passo seria a educação das crianças. Mas onde estão os mestres competentes para isso?
Teremos que ser nós, simples cidadãos honrados, a divulgar as boas ideias até que elas comecem a germinar nos pensamentos dos mais distraídos.
É uma luta persistente que não nos deixa esmorecer. Força amigo, não desanimes.
Um abraço
João
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