Extracto de entrevista recebido por e-mail. Apesar dos erros de transcrição, mantém interesses para reflectir sobra a situação económica nacional e os vícios do regime político. Eis o texto a que me dispenso de fazer comentários.
Reflexões pelo Professor Medina Carreira
Nota: O Professor Medina Carreira, um dos mais capacitados economistas portugueses, sempre que fala, deixa o País a reflectir, estupefacto. Aqui deixamos a síntese de uma das últimas entrevistas que concedeu e, a não perder.
"Vocês, comunicação social o que dão é esta conversa de «inflação menos 1 ponto», o «crescimento 0,1 em vez de 0,6»....Se as pessoas soubessem o que é 0,1 de crescimento, que é um café por português de 3 em 3 dias... Portanto andamos a discutir um café de 3 em 3 dias...mas é sem açúcar..."
"Eu não sou candidato a nada, e por conseguinte não quero ser popular. Eu não quero é enganar os portugueses. Nem digo mal por prazer, nem quero ser «popularucho» porque não dependo do aparelho político!"
"Ainda há dias eu estava num supermercado, numa bicha para pagar, e estava uma rapariga de umbigo de fora com umas garrafas, e em vez de multiplicar «6x3=18», contava com os dedos: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9... Isto é ensino... é falta de ensino, é uma treta! É o futuro que está em causa!"
"Os números são fatais. Dos números ninguém se livra, mesmo que não goste. Uma economia que em cada 3 anos dos últimos 27, cresceu 1% em 2... esta economia não resiste num país europeu."
"Quem anda a viver da política para tratar da sua vida, não se pode esperar coisa nenhuma. A causa pública exige entrega e desinteresse."
"Se nós já estamos ultra-endividados, faz algum sentido ir gastar este dinheiro todo em coisas que não são estritamente indispensáveis? P'ra gente ir para o Porto ou para Badajoz mais depressa 20 minutos? Acha que sim? A aviação está a sofrer uma reconversão, vamos agora fazer um aeroporto, se calhar não era melhor aproveitar a Portela? Quer dizer, isto está tudo louco!"
"Eu por mim estou convencido que não se faz nada para pôr a Justiça a funcionar porque a classe política tem medo de ser apanhada na rede da Justiça. É uma desconfiança que eu tenho. E então, quanto mais complicado aquilo for..."
"Nós tivemos nos últimos 10-12 anos 4 Primeiros-Ministros:
-Um desapareceu;
-O outro arranjou um melhor emprego em Bruxelas, foi-se embora;
-O outro foi mandado embora pelo Presidente da República;
-E este coitado, anda a ver se consegue chegar ao fim e fazer alguma coisa..."
"O João Cravinho tentou resolver o problema da corrupção em Portugal. Tentou. Foi "exilado" para Londres. O Carrilho também falava um bocado, foi para Paris. O Alegre depois não sei para onde ele irá... Em Portugal, quem fala contra a corrupção ou é mandado para um "exílio dourado", ou então é entupido e cercado."
"Mas você acredita nesse «considerado bem»? Então, o meu amigo encomenda aí uma ponte que é orçamentada para 100 e depois custa 400? Não há uma obra que não custe 3 ou 4 vezes mais? Não acha que isto é um saque dos dinheiros públicos? E não vejo intervenção da polícia... Há-de acreditar que há muita gente que fica com a grande parte da diferença!"
"De acordo com as circunstâncias previstas, nós, por volta de 2020, somos o país mais pobre da União Europeia. É claro que vamos ter o nome de Lisboa na estratégia, e vamos ter, eventualmente, o nome de Lisboa no tratado. É, mas não passa disso. É só para entreter a gente..."
"Isto é um circo. É uma palhaçada. Nas eleições, uns não sabem o que estão a prometer, e outros são declaradamente uns mentirosos: -Prometem aquilo que sabem que não podem."
"A educação em Portugal é um crime de «lesa-juventude»: Com a fantasia do ensino dito «inclusivo», têm lá uma data de gente que não quer estudar, que não faz nada, não fará nada, nem deixa ninguém estudar. Para que é que serve estar lá gente que não quer estudar? Claro que o pessoal que não quer estudar está lá a atrapalhar a vida aqueles que querem estudar. Mas é inclusiva.... O que é inclusiva? É para formar tontos? Analfabetos?"
"Os exames são uma vergonha. Você acredita que num ano a média de Matemática é 10, e no outro ano é 14? Acha que o pessoal melhorou desta maneira? Por conseguinte a única coisa que posso dizer é que é mentira! Está-se a levar a juventude para um beco sem saída. Esta juventude vai ser completamente desgraçada! "
"A minha opinião desde há muito tempo é TGV- Não! Para um país com este tamanho é uma tontice. O aeroporto depende. Eu acho que é de pensar duas vezes esse problema. Ainda mais agora com o problema do petróleo. "Bragança não pode ficar fora da rede de auto-estradas? Não? Quer dizer, Bragança fica dentro da rede de auto-estradas e nós ficamos encalacrados no estrangeiro? Eu nem comento essa afirmação que é para não ir mais longe... Bragança com uma boa estrada fica muito bem ligada. Quem tem interesse que se façam estas obras é o Governo Português, são os partidos do poder, são os bancos, são os construtores, são os vendedores de maquinaria... Esses é que têm interesse, não é o Português!"
"Nós em Portugal sabemos é resolver o problema dos outros: A guerra do Iraque, do Afeganistão, se o Presidente havia de ter sido o Bush, mas não sabemos resolver os nossos. As nossas grandes personalidades em Portugal falam de tudo no estrangeiro: criticam, promovem, conferenciam, discutem, mas se lhes perguntar o que é que se devia fazer em Portugal nenhum sabe. Somos um país de papagaios... Receber os prisioneiros de Guantanamo? «Isso fica bem e a alimentação não deve ser cara...» Saibamos olhar para os nossos problemas e resolvê-los e deixemos lá os outros... Isso é um sintoma de inferioridade que a gente tem, estar sempre a olhar para os outros. Olhemos para nós!"
"A crise internacional é realmente um problema grave, para 1-2 anos. Quando passar lá fora, a crise passará cá. Mas quando essa crise passar cá, nós ficamos outra vez com os nossos problemas, com a nossa crise. Portanto é importante não embebedar o pessoal com a ideia de que isto é a maldita crise. Não é!"
"Nós estamos com um endividamento diário nos últimos 3 anos correspondente a 48 milhões de euros por dia: Por hora são 2 milhões! Portanto, quando acabarmos este programa Portugal deve mais 2 milhões! Quem é que vai pagar?"
"Isso era o que deveríamos ter em grande quantidade. Era vender sapatos. Mas nós não estamos a falar de vender sapatos. Nós estamos a falar de pedir dinheiro emprestado lá fora, pô-lo a circular, o pessoal come e bebe, e depois ele sai logo a seguir..."
"Ouça, eu não ligo importância a esses documentos aprovados na Assembleia...Não me fale da Assembleia, isso é uma provocação... Poupe-me a esse espectáculo...."
"Isto da avaliação dos professores não é começar por lado nenhum. Eu já disse à Ministra uma vez «A senhora tem uma agenda errada"» Porque sem pôr disciplina na escola, não lhe interessa os professores. Quer grandes professores? Eu também, agora, para quê? Chegam lá os meninos fazem o que lhes dá na cabeça, insultam, batem, partem a carteira e não acontece coisa nenhuma. Vale a pena ter lá o grande professor? Ele não está para aturar aquilo... Portanto tem que haver uma agenda para a Educação. Eu sou contra a autonomia das escolas. Isso é descentralizar a «bandalheira»."
"Há dias circulava na Internet uma notícia sobre um atleta olímpico que andou numa "nova oportunidade" uns meses, fez o 12º ano e agora vai seguir Medicina... Quer dizer, o homem andava aí distraído, disseram «meta-se nas novas oportunidades» e agora entra em Medicina... Bem, quando ele acabar o curso já eu não devo cá andar felizmente, mas quem vai apanhar esse atleta olímpico com este tipo de preparação... Quer dizer, isto é tudo uma trafulhice..."
"É preciso que alguém diga aos portugueses o caminho que este país está a levar. Um país que empobrece, que se torna cada vez mais desigual, em que as desigualdades não têm fundamento, a maior parte delas são desigualdades ilegítimas para não dizer mais, numa sociedade onde uns empobrecem sem justificação e outros se tornam multi-milionários sem justificação, é um caldo de cultura que pode acabar muito mal. Eu receio mesmo que acabe."
"Até há cerca de um ano, eu pensava que íamos ficar irremediavelmente mais pobres, mas aqui quentinhos, pacíficos, amiguinhos, a passar a mão uns pelos outros... Começo a pensar que vamos empobrecer, mas com barulho... Hoje, acrescento-lhe só o «muito». Digo-lhe que a gente vai empobrecer, provavelmente com muito barulho... Eu achava que não havia «barulho», depois achava que ia haver «barulho», e agora acho que vai haver «muito barulho». Os portugueses que interpretem o que quiserem..."
"Quando sobe a linha de desenvolvimento da União Europeia sobe a linha de Portugal. Por conseguinte quando os Governos dizem que estão a fazer coisas e que a economia está a responder, é mentira! Portanto, nós na conjuntura de médio prazo e curto prazo não fazemos coisa nenhuma. Os governos não fazem nada que seja útil ou que seja excessivamente útil. É só conversa e, portanto, não acreditem... No longo prazo, também não fizemos nada para o resolver e esta é que é a angústia da economia
portuguesa."
"Tudo se resume a sacar dinheiro de qualquer sítio. Esta inter-penetração do político com o económico, das empresas que vão buscar os políticos, dos políticos que vão buscar as empresas... Isto não é um problema de regras, é um problema das pessoas em si... Porque é que se vai buscar políticos para as empresas? É o sistema, é a (des)educação que a gente tem para a vida política... Um político é um político. E um empresário é um empresário. E não deve haver confusões entre uma coisa e outra. Cada um no seu sítio. Esta coisa de ser político, depois ministro, depois sai, vai para ali, tira-se de acolá, volta-se para ministro...é tudo uma sujeira que não dá saúde nenhuma à sociedade."
"Este país não vai de habilidades nem de espectáculos. Este país vai de seriedade. Enquanto tivermos ministros a verificar preços e a distribuir computadores, eles não são ministros! Eles não são pagos nem escolhidos para isso! Eles têm outras competências e têm que perceber quais os grandes problemas do país!"
"Se aparece aqui uma pessoa para falar verdade, os vossos comentadores dizem «este tipo é chato, é pessimista».... Se vem aqui outro trafulha a dizer umas aldrabices fica tudo satisfeito... Vocês têm que arranjar um programa onde as pessoas venham à vontade, sem estarem a ser pressionadas, sossegadamente dizer aquilo que pensam. E os portugueses se quiserem ouvir, ouvem. E eles vão ouvir, porque no dia em que começarem a ouvir gente séria e que não diz aldrabices, param para ouvir.
O Português está farto de ser enganado! Todos os dias tem a sensação que é enganado!"
Miguel Sousa Tavares - Uma opinião corajosa
Há 4 minutos
8 comentários:
Medina Carreira faz reflectir? Se faz, amigo João Soares! Eu estou, simplesmente, d e l i c i a d a com o discurso!!! Isto é e x a c t a m e n t e o que eu penso do nosso país. E se me pedissem uma opinião política, eu responderia, "leiam o discusrso de Medina Carreira, porque eu penso t a l e q u a l como ele" e não teria de gastar o meu latim.
Obrigada, amigo, já não preciso de dizer-lhe que não quero falar da pilítica em Portugal. Tem aí o que eu penso, nestes depoimentos que ele fez.
Um abração.
Maria Letra
Cara Maria Terra,
Há quem o defina como pessimista, mas parece-me que é muito realista e clarividente. Fala para todos perceberem e diz as coisas de forma directa e simples.
Gosto de o ler, já que não o costumo ouvir por não perder muito tempo em frente da TV.
Há outros economistas parecidos com ele: Manuel Jacinto Nunes, Silva Lopes e, de certo Modo, João Salgueiro.
É pena não haver economistas inteligentes em funções de decisão: evitariam que se caísse na crise, provocada por falta de honestidade, pela ganância desmedida, pelo endeusamento do dinheiro acima de valores éticos.
Agora precisa-se de saber e de coragem para alterar profundamente todo o sistema financeiro e empresarial.
Um abraço
João Soares
Partilho muitas das opiniões de Medina Carreira, no entanto creio que peca por ausência de sugestões.
Ele aponta os problemas, é directo, assertivo e sincero, mas tal como um médico o economista também deve prescrever receitas...
Só não concordo quando ele diz que "o Português está farto de ser enganado". Não devemos estar, caso contrário já teríamos tomado uma atitude.
Caro AP,
Talvez estejam fartos mas não saturados, o que significa d~que, de um momento par o outro, a atitude surgirá. Oxalá não seja uma erupção descontrolada cuja lava destrua o rectângulo.
Claro que o diagnóstico é a primeira fase para resolver a maleita. Agora espera-se que ele ou outro atire para o público a terapia adequada.
Um abraço
João Soares
Caro amigo João
Assisti em directo à entrevista do Professor Medina Carreira (como tenho assistido a todas, penso eu...) além de ter recebido vídeos de duas de suas entrevistas.
Mas ler é melhor, dá para reflecxtir em cada frase que se lê, sem estar com a pressa de ouvir o que vem a seguir.
Considero o Professor uma das "grandes cabeças" que há em Portugal - porque as há, não tenho dúvidas. Só é pena que não sejam aproveitadas...
Eu é que aproveito para agradecer a sua visita à minha "Casa", enriquecendo, com o seu comentário, o meu humilde espaço.
Beijinhos
Mariazita
Cara Amiga Mariazita,
Estava preocupado com o seu silêncio, inclusivamente em comentários quer no Sempre Jovens, quer nas respostas na sua Casa, e tinha decidido amanhã procurar saber da sua saúde. Foi com agrado que encontrei este comentário.
Quanto ao seu apreço pelo economista Medina Carreira, gostava que a TV organizasse um programa de uma hora pelo menos com ele, o Prof Manuel Jacinto Nunes, o Prof Silva Lopes, o prof João Salgueiro e, se possível, mais um ou dois do mesmo quilate, para debaterem a crise e proporem medidas estruturais para a combater e evitar o perigo de aparecer outra. Isto seria a continuação da análise de diagnóstico que este post apresenta e a que se deve seguir a terapia, que deve ser radical, eliminando as causas mais profundas.
Um abraço
João Soares
Eu por acaso tive oportunidade de ver a entrevista do professor Medina Carreira, e que nutro uma profunda admiração pela sua seriedade de análise. Ele coloca o dedo na ferida em muitos aspectos da nossa economia e na nossa (des)governação destes últimos 30 anos, sem dúvida é uma pessoa acreditada e devemos todos atender aos seus alertas.
Abraços do Beezz
Caro Beezz,
Sem dúvida, independentemente da cor política, que possa ter, a sua frontalidade e clareza de vistas merece aplauso. Como atrás já ficou dito, é preciso que apareçam hipóteses de solução para uma reforma da estrutura das finanças internacionais, para moralizar a Política. Infelizmente os políticos actuais esqueceram que Política é a ciência e arte de bem gerir os interesses dos Estados para benefício dos cidadãos. Preferem ver a política - com p minúsculo - com a «habilidade» de se governarem a si e aos boys dos partidos e caçar o máximo de votos, mesmo que os métodos utilizados prejudiquem seriamente os cidadãos.
Esperam-se as opiniões de mais pensadores sobre o diagnóstico e, principalmente, sobre a terapia para moralizar o sistema.
Um abraço
João Soares
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