Por constituir um complemento muito interessante ao tema tratado em «Cavaco, jovens e a democracia», transcrevo do blogue «Ecos e comentários» o post «Opinião» que contém o artigo do Prof. Moisés Espírito Santo, seguido de um comentário de António Delgado autor do blogue. Agradeço comentários que contribuam para maior aprofundamento do assunto que é muito vasto é abrangente.
OPINIÃO
Reproduzo um excelente artigo de opinião do Prof. Moisés Espírito Santo sobre o discurso do Presidente da República, no dia 25 de Abril, alusivo ao estudo por ele encomendado sobre a informação politica dos jovens. O dito artigo saiu no Jornal de Leiria em 1 de Maio de 2008
Senhor Presidente da República, os jovens têm razão e recomendam-se
O Presidente da Republica, nas comemorações do 25 de Abril e no Parlamento, fez um discurso sobre a cultura política dos jovens deduzida dum estudo da Universidade Católica que a Presidência encomendou. Pretendeu fazer passar um retrato negro da formação política dos jovens. Eu, que não tenho compromissos com os políticos, até considero que a cultura política dos jovens é boa. Antes de mais, o Presidente atribuiu as culpas aos deputados («os responsáveis sois vós») quando o Professor Cavaco Silva governou o País durante dez anos. E deu estes três exemplos de «ignorância política» dos jovens: a maioria
1) não sabe quem foi o primeiro presidente eleito depois do 25 de Abril;
2) desconhece o número exacto dos países que integram a União Europeia;
3) ignora que o P.S. tem maioria absoluta no Parlamento.
E com isto fez figura, tendo sido repercutido por todos os média, como um alerta pela «nossa democracia». Pergunto eu: o que é que vale isso? Devia é ter citado outros dados do mesmo Estudo (segundo o Público) como, por exemplo:
a) interessam-se mais pelas «petições e pelo boicote de produtos por razões políticas ou ambientais do que o resto da população»;
b) não atribuem eficácia ao voto;
c) têm dificuldade em se identificarem com «a oferta partidária»;
c) acham pouco ou nada importante a separação entre esquerda e direita;
d) só 20% «sentem simpatia» pelo voto eleitoral;
e) entre eles há «concordância genérica» pela criação de novos mecanismos de participação dos cidadãos nas decisões políticas e de mudar o sistema eleitoral de forma a dar mais ênfase aos candidatos e menos aos partidos políticos», etc.
Ora estes temas (não citados pelo Presidente) é que são importantes e retratam, isso sim, o falhanço da «nossa» democracia. (Quando os políticos dizem «nossa democracia», face a estes dados, entende-se que essa democracia é «a deles», da «classe política»). Ora, com a maioria dos políticos que temos até é sinal de boa cultura ignorar os seus nomes, o seu número no Parlamento e, depois das manigâncias com o Tratado de Lisboa para o qual se prometeu um referendo, é natural que se ignore quantos países compõem a «nossa Europa» (a deles). Isso só interessará aos «jotas» dos partidos que são amestrados para reproduzir as manhas dos «velhos».
Note-se a alínea e) que referi : «Há concordância genérica em que se devia mudar o sistema eleitoral de modo a dar mais ênfase aos candidatos e menos aos partidos políticos». Ora, aqui é que está o busilis, quer dizer, a razão do desinteresse dos jovens (e dos adultos) pelos nomes e pelo número de políticos. Os jovens têm razão e recomendam-se.
Na Europa, Portugal é o único em que os candidatos a deputados têm de ser propostos pelos partidos e, por outro lado, em que se exige um número de inscritos para se constituir um partido. Na Europa, para uma eleição, os Estados só reconhecem os cidadãos. A «nossa» democracia (a deles) faz dos cidadãos simples votantes, ou claque; e só serve para caucionar a «classe política». É a razão por que a maioria da juventude se desinteressa da informação política.
A propósito: as comemorações do 25 de Abril não passaram duma retórica sobre a «nossa» democracia de que se servem os profissionais da política. Quem é que se lembrou de recordar ou homenagear os milhares de portugueses (trabalhadores, intelectuais, estudantes, emigrantes...) que lutaram, anonimamente, clandestinamente, quotidianamente, civicamente, contra o fascismo e pelos Direitos Humanos, de 1928 até 1974? E que sofreram nas prisões ou na solidão da clandestinidade? E que perderam o trabalho e o conforto familiar? E que definharam no Tarrafal ou tiveram de fugir para o estrangeiro? Uma homenagem a esses anónimos, ou desnomeados, que agiram pela liberdade de todos e não com vistas a um emprego - dos melhores cidadãos que a Pátria engendrou - é que seria uma comemoração cívica do 25 de Abril, e não esta parada folclórica de auto-afirmação dos actuais políticos que vieram usufruir daquilo que os outros semearam.
Publicada por ANTONIO DELGADO em Quinta-feira, Maio 01, 2008
NOTA: de um comentário de António Delgado:
Na mesma edição do JL fui convidado a participar no seu Forum no seguinte ponto:
"Como comenta o alheamento dos portugueses, nomeadamente dos mais jovens, relativamente à actividade política e às datas que marcaram a história recente de Portugal?"
A minha resposta:
"A " Aldeia Global" de McLuhan infelizmente mostra-nos em que medida a evolução da sociedade em direcção a um futuro de telecomunicação total da informação implica mudanças substanciais e decisivas na própria maneira de se ver e actuar no mundo. Uma delas é a alienação. É dentro deste paradigma que se deve de entender as respostas dos jovens por mostrarem que não aderem cabalmente às coisas do interesse dos políticos. A informação espectáculo, alvitrada por Guy Debord, faz parte igualmente do paradigma comunicacional do nosso tempo, em certo modo, é onde se deve incluir o discurso do Sr. Presidente da República por salientar apenas os pontos do seu interesse."
António
sexta-feira, 2 de maio de 2008
A política não é atractiva
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3 comentários:
João Miranda, investigador em biotecnologia no artigo de opinião «Jovens e política»
http://dn.sapo.pt/2008/05/03/opiniao/jovens_e_politica.html diz que
«A intervenção do Presidente da República nas comemorações do 25 de Abril criou a ideia de que os jovens não se interessam pela política partidária. Este alegado desinteresse incomodou a geração de políticos que fez o 25 de Abril. A cultura revolucionária destes políticos impede-os de perceber que a excessiva politização da vida pública não é um valor a promover mas um vício a evitar. As sociedades politizadas premeiam a habilidade política e as demonstrações de força na rua. As sociedades despolitizadas premeiam o mérito individual, o trabalho e a iniciativa empresarial. O eventual desinteresse dos jovens pela política partidária é um bom sinal. É um sinal de que a sociedade falhada construída pela geração do 25 de Abril pode ter os dias contados.»
Merece reflexão.
A. João Soares
Há um artigo do Vasco Pulido Valente sobre este tema que responde bem porque a politica não é atractiva para a juventude.
O texto referido pelo Luís é o seguinte. Seguinte o estilo característico do seu autor que, goste-se ou não, merece ser meditad:
O desinteresse pela política
Vasco Pulido Valente - 20080503
O Presidente da República lamentou no discurso do '25 de Abril', um discurso que já foi solene e já foi importante, o desinteresse da juventude pela política. A audiência concordou. Mas, sinceramente, o que esperam os políticos? Desde que se puseram aí a abraçar e a beijocar o povo e a pedir um minutinho de televisão para se exibir, perderam a inacessibilidade e a autoridade e, perdendo isso, não lhes ficou muito. Para começar, não são gente susceptível de atrair ninguém. Tirando Mário Soares, que é uma 'estrela' natural, e até certo ponto Marcelo Rebelo de Sousa, o resto, mesmo no seu melhor, não passa de uma pequena multidão indistinta e mesquinha. Há um ou outro videirinho, um ou outro aventureiro, um ou outro louco - um grande homem ou uma grande mulher não há. Quem vai perder tempo com as mediocridade que, só Deus sabe porquê, nos pastoreiam hoje?
E que têm elas para oferecer, além de uma retórica morta e desprezível. A guerra do século XX entre a liberdade do Ocidente e o comunismo russo acabou para sempre. Em 2008, ninguém pensa em ir morrer heroicamente na guerra de Espanha ou em entrar aos 17 anos na vida horrível e brutal da clandestinidade como Zita Seabra. Quando por acaso 'adere' a um partido, a juventude que por aí anda quer, como lhe compete, um emprego. Não se lhe pode pedir que queira diferente ou queira mais. Seria absurdo que a redução do défice e a 'modernização' de Portugal inspirassem qualquer espécie de fé, dedicação ou sacrifício. Pior ainda: é Bruxelas quem manda no défice e a 'modernização' de Portugal é uma coisa tão larga e tão ambígua que, na prática, não existe. Que escolha fazer perante o vácuo?
Uma escolha pessoal, evidentemente. No século XX, um indivíduo poucos vezes se sentia, por assim dizer, 'fora da história'. Era pela liberdade contra a ditadura, pela nação contra a revolução, pelo proletariado contra a burguesia. Não era neutro com facilidade. O destino de cada um não se distinguia com precisão do destino colectivo, como o PREC durante uns meses pareceu demonstrar em Portugal. Agora, com a democracia estabilizada e a economia de mercado, o indivíduo não pertence a 'parte' alguma e não partilha nenhum destino. Aprendeu a desconfiar do Estado e da mítica igualdade que o Estado pretende estabelecer; e, sobretudo, a contar exclusivamente consigo. Não vê a política como um encontro e uma comunidade. Vê a política como um negócio e uma questão de clientelas. Não se interessa? Claro que não se interessa.
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