domingo, 7 de fevereiro de 2010

Comemorar a República ou fazer propaganda?

Num convívio de amigos em 27 de Janeiro um dos presentes sugeriu que cada um preparasse uma lista com os erros cometidos após o 5 de Outubro para serem tema de conversa no convívio deste mês. Achei difícil porque mais do que classificar de erro acontecimentos de tantas dezenas de anos, conviria analisar as circunstâncias em que foram tomadas decisões, porque, embora hoje possam ser consideradas erradas poderiam ter sido as melhores perante os factores vigentes no momento.

Mas hoje, o artigo de António Freitas Cruz, que a seguir se transcreve, aponta deficiências substanciais de que ainda hoje sofremos as consequências, em grande parte agravadas pelas revoluções subsequentes, de 28 de Maio e de 24 de Abril. Por isso deverá haver cuidado nos discursos para serem realistas e analíticos e não se traduzirem em propaganda e lavagem de erros graves, que possa interessar a alguém com carência de escrúpulos.

Os bons avisos da República
Jornal de Notícias, 7 de Fevereiro de 2020. Por António Freitas Cruz

Que fique bem entendido: não sou monárquico, nunca fui e, de resto, acho que não há em Portugal uma questão de regime. Na verdade, o que me importa é a Democracia, o Estado de Direito, o Estatuto da Liberdade. Ora, nos 16 anos da I República não se vislumbra a concretização de nenhum destes três objectivos, o que me faz considerar desproporcionado o estilo das comemorações, a correrem entre o eufórico e o glorioso. Deixem-me dizer que os discursos até agora ouvidos me pareceram meras tentativas de branqueamento da História.

De facto, se há aspectos em que o regime iniciado há 100 anos se não recomenda é precisamente naqueles três: porque a Democracia só se vai construindo fazendo alguma coisa por ela, o que não aconteceu; porque o Estado Direito também vai nascendo se houver vontade política, e não houve; e porque a Liberdade dos cidadãos tem que ser uma preocupação permanente, e nunca foi.

Democracia só a alcançamos 70 anos mais tarde. Quanto ao Estado de Direito e à Liberdade, devemos reconhecer que já tiveram, depois disso, melhores dias…

Os que se reclamam da "ética republicana" não conseguem ocultar a série negra de perseguições e assassinatos (até de correlegionários) e o descalabro das finanças. A lendária honestidade e a generosa entrega aos ideais de muitos republicanos não chegam para amenizar o desastre.

Deu no que deu: a emergência de um "salvador" imediatamente acolhido por um povo farto de desordem.

É por isto que não entendo os discursos apologéticos do regime e dos homens de 1910, apontando-os como exemplos a copiar hoje. Parece-me que seria mais útil apontá-los como sérios avisos.

2 comentários:

Luis disse...

Caro João,
O problema foi muito bem analizado e concordo em absoluto com o exposto. O problema não é nem nunca foi de regime! Foi e será sempre pela forma como os (des)governantes interpretam e faze a governação...
Um abraço amigo.

A. João Soares disse...

Caro Luís,

O mal está realmente na intenção que leva as pessoas para a política. Não vão com vontade de ficar na história por fazerem um bom trabalho em benefício dos portugueses, mas para viverem uns anos bem passados acumulando fortunas que o seu mérito não lhes permitiria na vida privada, e criando uma corte de admiradores dependentes com tachos à custa dos impostos. Depois de criado o sistema, é difícil serem demitidos, porque têm o apoio daqueles que dependem dos tachos distribuídos. Por isso é que o Estado se transformou num conglomerado de empresas com capital Público e centenas de institutos variados onde se encaixam os incompetentes para vencer na vida com o seu saber e capacidade.
Há dias passou um e-mail que dizia que há poucos anos havia na CP por cada administrador e director umas dezenas de trabalhadores hoje os tachistas aumentarem de tal forma que por cada um há apenas menos de uma dezena de trabalhadores.
Como é que uma tal empresa pode dar lucro? E assim se constrói o défice.

Um abraço
João