Transcrição:
A mentira de Rangel
Jornal de Notícias, 16 de Fevereiro de 2010, por Paulo Ferreira
Paulo Rangel, candidato à liderança do PSD, aprendeu depressa. Aprendeu a produzir "soundbites". Aprendeu a mover-se no aparelho partidário. Aprendeu a controlar os "tempos" da política. Aprendeu a formatar a imagem de intelectual que chega à política com o único intuito de ajudar o país a erguer-se da miséria, em contraponto aos que estão há demasiado tempo no "establishment" - aqueles de quem o "povo" desconfia e trata por "eles". Não admira: Paulo Rangel é um homem inteligente. Ocorre, porém, que o candidato à sucessão de Ferreira Leite também aprendeu depressa a mentir. Sim, a mentir de forma descabelada, não hesitando em usar gordas falsidades para sustentar a tese que a cada momento lhe convém. Mentir é sempre feio. Mentir como Paulo Rangel mentiu no Parlamento Europeu (PE) é feio, muito feio.
Os factos são os que se seguem.
Facto um. Uns dias antes de dizer ao país que deixará o PE para vir salvar Portugal, Paulo Rangel usou da palavra para informar os seus parceiros europeus do seguinte: "Queria denunciar aqui aquilo que se está a passar em Portugal neste momento, onde é claro que a comunicação social trouxe à luz um plano do Governo para controlar os jornais, para controlar estações de televisão, para controlar estações de rádio" (sic). Concluiu Rangel: tudo isto "põe em causa a liberdade de expressão". Truculento no uso da linguagem como é, o (ex) eurodeputado deve ter feito um figurão.
Facto dois. Para sustentar este quadro de terror, Rangel deu o exemplo de um "jornalista muito conhecido, Mário Crespo", que "viu censurada uma crónica sua, também por sugestão, ou aparente sugestão, do primeiro-ministro" (sic). Ao dizer isto, Paulo Rangel disse uma gigantesca mentira, sem nenhum facto, nenhum indício de que o proclamava tem correspondência com a realidade.
Por que razão é isto importante? Porque revela um (péssimo) traço de carácter. Revela que Paulo Rangel, que tanto gosta de aspergir moral sobre os ímpios, mente. Esse não é um facto de somenos, numa altura em que temos um primeiro-ministro acusado, por vários quadrantes, de usar a mentira para contornar os obstáculos.
Donde se impõem as perguntas:
- um homem que mente assim numa instância tão relevante como o PE pode ser líder do principal partido da Oposição?
- Se vencer a luta pela liderança do partido e concorrer a primeiro-ministro, como saberemos se, a cada declaração de substância que produz, não estará Rangel a mentir?
- E se chegar a primeiro-ministro?
- Que confiança deve Rangel merecer dos portugueses?
Solução possível: talvez tenhamos que o fazer passar, regularmente, por um detector de mentiras. Para descanso de todos nós.
NOTA: Depois de tantas suspeitas levantadas ao Governo por mentiras, surge agora esta referente a um elemento da oposição que pretende guindar-se a alto cargo. Fica a dúvida se foi posta de lado definitivamente a receita da transparência e da verdade e já é aceite que a mentira é uma doença incurável de todos os políticos. Da parte de Rangel, não é de estranhar depois de ter afirmado na Universidade de Verão do seu partido no Alto Alentejo, citando Nicolau Maquiavel, que a ética e a política nada têm a ver entre si. São coisas inconciliáveis. Talvez quisesse dizer que a Política deixou de ser uma arte e ciência de governar um País para o desenvolvimento e para o bem-estar e as condições de vida das pessoas, e passou a ser um conjunto de manhas e aldrabices para iludir a população e adquirir o máximo de poder , mantê-lo e abusar dele, sem olhar a meios.
2 comentários:
Caro João,
Quanto mais conheço os nossos políticos mais gosto dos animais! Eles são mais leais... e não mentem!!!
Um abraço amigo.
Amigo Luís,
Nada é perfeito no mundo, e uma das imperfeições da sociedade portuguesa é a incultura, a aversão á reflexão, o gosto pelo rebanho, por alinharem na manada sem ser preciso pensar para onde o pastor os quer levar. Apareceu um comentador a gabar-se porque é do PS e que o pai já era. No futebol seguir o clube do pai ainda vá lá, não traz mal ao País, mas recusar avaliar a situação actual só porque o PS sempre foi um «grande partido» não me parece ser de gente bem dotada.
Um abraço
João
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