Jardim e os pintalegretes
Fernando Marques, Jornalista do JN
Todos os políticos se reconhecem em Alberto João Jardim. Quando o atacam, quando se envergonham dele, atacam-se a si mesmos, envergonham-se de si mesmos. Jardim é o seu alter-ego inexorável. Como não suportam o peso daquela imagem burlesca dentro de si, projectam-na para um alvo fácil, longínquo e oferecido. E depois sacodem os ombros, convencidos de que são o que não são.
O que é um político? É um tipo que faz trinta por uma linha para alcançar um lugar de poder e depois faz trinta por uma linha para o conservar. É um tipo que, sabendo cem por cento de uma verdade ou de uma mentira, usa apenas a fracção que mais convém à sua estratégia. Não há nenhuma diferença entre o comportamento político de Alberto João Jardim e o de José Sócrates, Cavaco Silva, Rui Rio ou António Costa. Defendem todos as suas percentagens da verdade e da mentira.
Jardim distingue-se dos outros por ser uma ilha. Casa a sua expressão pública com o temperamento exuberante do arquipélago que governa. É colorido, é montanhoso, é quente, é duty free. Não precisa de conter o pintalegrete dentro dele. Solta-o, exibe-o, dá-lhe asas. É a sua força, o seu batuque, o seu feitiço, o seu swing. Nada disto altera a essência do que ele faz enquanto presidente do governo regional manobra no seu tabuleiro da verdade e da mentira, como todos os políticos. A Madeira adora-o. Dá-lhe maiorias absolutas. Quem vê nele apenas um arlequim, que juízo faz do povo que o elege?
Os políticos sisudos renegam o pintalegrete de João Jardim porque, revendo-se nele, compreendem que são exactamente o que ele é. Então, envergonhados, despojam-se das cores traiçoeiras do pedantismo e da leviandade e tornam-se cinzentos. Têm vozes cinzentas, discursos cinzentos, fatos cinzentos e carros cinzentos. Contratam especialistas em sorrisos cinzentos, olhos cinzentos e vidas cinzentas. O pintalegrete a fervilhar por dentro, eles a contê-lo por fora. Miram-se no espelho e vêem-se cinzentos, embora se sintam amarelos, verdes, vermelhos, azuis, cor-de-rosa. Nada disto, porém, altera a essência do que eles fazem enquanto políticos manobram no seu tabuleiro da verdade e da mentira.
Os olhos cinzentos dos políticos cinzentos vêem no líder madeirense um louco, um arrivista, um provocador, um espadachim, um fanfarrão. E vêem-no assim porque, no fundo, se vêem assim. Como bem sabe o líder cinzento do PSD, Marques Mendes, que hoje posará ao lado de João Jardim na festa do Chão da Lagoa, um ano depois de ter sido impedido de participar no evento. Estou certo que o seu pintalegrete oculto sabe o que está a fazer.
A Necrose do Frelimo
Há 3 horas
2 comentários:
Bom domingo, abraço,
( lapidar, lapidar ).
Caro Pinto Ribeiro,
Realmente, Fernando Marques expõe aqui umas reflexões interessantes a ter em consideração sempre que se façam análises políticas. Foi por isso que o transcrevi.
Abraço e bom domingo (aqui com muito calor)
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