sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Leste Europeu e Rússia

No post Relações internacionais mais pacíficas?, parecia desenhar uma evolução acentuada para a paz pelo diálogo, que iria mudar rapidamente o mundo. Mas não tenhamos ilusões porque tudo na humanidade, se altera mas com ritmo lento, mais vagaroso do que os comportamentos das pessoas, devido ao peso dos interesses que estão em jogo.

E, muitas vezes, quando tudo parece bem encaminhado, pode surgir um pormenor que faz rebentar a violência, como aconteceu no caso do Iraque, em que Sadam que estava prestes a ceder, voltou a atrás devido à sua interpretação da visita de empresários petrolíferos franceses. Vale, por isso a pena prestar atenção a situação relatada no artigo que se transcreve a seguir:

Leste Europeu se une para conter avanço da Rússia
AP, REUTERS E NYT

Na mira de Moscovo, Ucrânia se junta a países da antiga Cortina de Ferro para evitar novas intervenções militares.

A invasão russa da Geórgia assustou os países do Leste Europeu, principalmente as ex-repúblicas soviéticas. Líderes de Lituânia, Estónia, Letónia, Polónia e Ucrânia se reuniram esta semana para expressar solidariedade a Tbilisi e tomar medidas para evitar outras intervenções militares semelhantes. O primeiro resultado concreto dessa coalizão foi percebido ontem, quando o presidente da Ucrânia, Viktor Yushchenko, impôs restrições à movimentação militar da Rússia em território ucraniano.

A medida afecta principalmente a frota russa no Mar Negro, que está baseada no porto ucraniano de Sebastopol. A partir de agora, os navios de guerra e a aviação russa devem pedir permissão a Kiev com pelo menos 72 horas de antecedência antes de qualquer operação.

"Se não forem cumpridas essas exigências, as autoridades podem pedir aos navios de guerra, aos de abastecimento e às aeronaves russas que abandonem o território ucraniano", diz o documento emitido ontem pelo governo da Ucrânia.

Moscovo afirmou que a decisão é uma "medida grave". "O governo da Ucrânia tomou uma grave medida contra a Rússia", declarou Sergei Lavrov, ministro russo das Relações Exteriores. "A determinação complica gravemente as atividades da frota, em contradição com o acordo russo-ucraniano."

Com o desmantelamento da União Soviética, nos anos 90, Rússia e Ucrânia dividiram a Frota do Mar Negro. Em 1997, os dois países assinaram um acordo que permitiu que a Marinha russa usasse o porto de Sebastopol, na Ucrânia.

Em Maio, Yushchenko afirmou que não renovará o acordo, o que levou os russos a apressar a construção de um porto em Novorossiysk, também no Mar Negro.

O aumento das tensões entre Moscovo e Kiev fez muitos analistas apontarem a Ucrânia como o próximo alvo da Rússia. Um quarto da população ucraniana fala russo e vive na margem leste do Rio Dnieper, onde estão os principais centros urbanos e a maior parte da riqueza do país.

A divisão étnica é o pano de fundo da instabilidade política. Yushchenko, o presidente, e a primeira-ministra, Yulia Timoshenko, simpatizam com o Ocidente e defendem a entrada da Ucrânia na NATO. O opositor, Viktor Yanukovich, é pró-Moscou. A Rússia faz o que pode para manter o país sob controlo. Uma das armas preferidas do Kremlin é o corte do fornecimento de gás em pleno Inverno. Para Kiev, a questão é delicada. Cerca de 25% do gás consumido pela Ucrânia é russo. O resto, que vem de países da Ásia Central, como Turcomenistão e Casaquistão, é exportado pela estatal russa Gazprom.

Os europeus também são dependentes do gás russo. Cerca de 80% das exportações de gás da Rússia para a Europa passam pela Ucrânia e um quarto do gás consumido pelos europeus chega pelo território ucraniano.

A única possibilidade de a Europa diminuir essa dependência seria importar directamente gás de países da Ásia Central, o que só poderia ser feito através de um gasoduto que passa pela Geórgia.

A Rússia corre contra o tempo para manter o mercado europeu em duas frentes: obtendo controle sobre a Geórgia e fechando acordos com os países da Ásia Central para exploração e importação do gás.

Pressão

Para os líderes dos países da antiga Cortina de Ferro, a maneira de conter o avanço russo é promover a entrada da Geórgia e da Ucrânia na NATO. Ontem, Lituânia, Estónia e Letónia, que já são membros da organização, pressionaram os outros membros da aliança a elaborar um plano para a entrada dos dois países.

A medida tem apoio dos EUA e da Grã-Bretanha, mas conta com forte oposição de Alemanha, Itália e França, que não querem comprometer nem o fornecimento de gás nem as relações bilaterais com a Rússia. A proposta de inclusão de Geórgia e Ucrânia foi rejeitada na cúpula da NATO, realizada em Abril, na Roménia.

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro João,
O que nos vale é o acordo que Sócrates fez com a Argélia e Líbia para o gás e petróleo, não precisamos da Rússia!
Agora a sério: caso difícil, sem dúvida e que vai exigir muito tacto por parte do ocidente.
Parece-me que os fantasmas da guerra fria voltaram. Vamos confiar na diplomacia e que não se repitam erros do passado...
Abraço.

A. João Soares disse...

Caro AP,
A guerra fria é preferível à guerra efectiva. Há no entanto um inconveniente, que é o de exigir uma diplomacia a funcionar na perfeição e com serviços de informação eficientes. É que se vive no fio da navalha e qualquer deslize dá drama.
Ora, a diplomacia actual funciona mal, com a obsessão de utilizar a Comunicação Social, perde-se o bom senso e a discrição. Por outro lado, com essa obsessão, não pode haver informações que funcionem porque deixa de haver segredo e o «bluff» deixa de poder ser bem conduzido e pode dar erros como aconteceu na guerra no Iraque.
A experiência do passado dá sempre boas lições, mas não podem ser utilizadas pelo método «copiar e colar», sendo indispensável o cuidado de as adaptar ao mundo de hoje que é muito diferente. Cada momento é diferente do anterior.
A situação nas bordas da Rússia vai piorar muito e é preciso muita calma e conversação. A negociação entre os grandes é difícil por não haver paciência para ouvir conselhos de terceiros credíveis. O argumento mais atendido durante a guerra fria era o número de ogivas nucleares. E hoje esse argumento embora não possa ser posto de lado, apresenta aspectos muito diferentes.
Devemos estar atentos.
Um abraço
João