Em conversa com uma bancária, ouvi repetidamente a palavra calma. Os depositantes devem ter calma, os investidores devem ter calma… Porém, nenhum responsável credível emite afirmações coerentes e sustentadas que inspirem tal calma. O que dizem hoje não confirma o que disseram ontem e não será confirmado amanhã.
Não sabem, não adivinham a evolução que ocorrerá. Os economistas não tiveram capacidade para proceder de forma correcta por forma a evitar a crise ou, pelo menos, evitar que ela fosse tão grave. Houve erros sucessivos na busca de mais lucros, contrariando os mais elementares valores éticos, morais e sociais. Ninguém sabe nada e, agora, não falam claro, em condições de serem compreendidos e de inspirarem a tal calma que todos sugerem.
Fica-se com a impressão de que existe um desleixo generalizado, uma grave falta de dedicação às tarefas de que são encarregados. E esta moléstia parece ter alastrado por todos os países. A humanidade está em crise profunda, os valores morais estão a fazer muita falta e não são substituíveis por um materialismo fiduciário selvagem.
E os casos concretos sucedem-se com aspectos anedóticos. Por exemplo, a Alta Autoridade da Concorrência deveria seguir em permanência todos os casos mais ou menos suspeitos e actuar em conformidade e com a oportunidade adequada. Deveria ter estudos, em actualização dia-a-dia. Mas não. Colocada, agora, perante a suspeita de cartelização dos preços dos combustíveis, promete ter um estudo pronto EM FINS DE MARÇO, daqui a quase SEIS MESES, meio ano!!! Nem na época dos computadores conseguem em menos tempo analisar os dados que deviam ter em permanência e que têm dado tanto que falar, há vários meses? Será que ainda fazem contas pelos dedos? Qual é afinal o papel de tal organismo, além de receberem bons ordenados? Qual o benefício para os cidadãos portugueses resultante da sua existência?
Outro caso é o negócio do «Magalhães» anunciado com tanta pompa e circunstância, sem nenhum dos inúmeros assessores ter levado à ministra da Educação e ao PM a informação da situação suspeita da empresa fornecedora em relação ao fisco. E o caso foi muito duvidoso duvidoso, pois nem sequer houve concurso público entre os vários tipos de computadores semelhantes, em uso pelo mundo fora. Será que tal pressa e tal decisão urgente tinha por finalidade o amortecimento do processo fiscal contra a firma? Será que houve influência (mesmo que por distracção ou omissão) de elementos dos gabinetes ministeriais, como é lógico duvidar? E ninguém vai ser chamado à pedra? Não haverá responsáveis?
É um sinal dos tempos. Exigem-se direitos e mais direitos de toda a espécie, mas não se fala de deveres, de responsabilidades, de definição de tarefas, de controlos, de avaliação de desempenho. Depois, em consequências de muitas «habilidades» sucessivas, surgem as crises que ninguém soube ou quis evitar ou minorizar e os «sábios», em voz pouco convincente, acabam por dizer que é preciso calma!!!
quarta-feira, 8 de outubro de 2008
A crise podia não ter existido
Publicada por A. João Soares à(s) 17:12
Etiquetas: combustíveis, crise, desleixo, irresponsabilidade, Magalhães
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4 comentários:
El Presidente Sarkozy debía tener un entrevista con el Presidente Cavaco Silva, economista de gran solvencia
Caro A.João,em primeiro lugar dizer que é um prazer ler os seus textos.
Mas o que me leva a escrever o presente comentário é o seguinte e que começa a ser muito comum:
Não crê o meu caro amigo que passar permanentemente a idéia de que o 1ºMinistro anda sempre mal informado e que os incompetentes são os que o rodeiam pode não corresponder à verdade?
Não é sempre o chefe do governo que deve ser o responsável pela governação?
Acredito que o faz com toda a boa convicção e seriedade.
Mas para quem já assistiu a verdadeiros massacres sobre outros chefes de governos anteriores por pormenores como os motores indonésios nas OGMA,que vinham num contingente com origem em França,um ministro que teve que apresentar demissão por dizer uma piada,Santana porque vinha à janela ou porque não falou ou deveria ter falado e muitas outras situações como deve recordar,percebe que esta perspectiva serve às mil maravilhas para a construção do mito em torno do "Engenheiro" e pouco mais,uma vez que apenas lança as responsabilidades pelas asneiras ruinosas em que nos envolveram a todos,num destinatário difuso,mal conhecido,que afinal leva a que tudo continue na mesma.
Perdoe o desabafo,
cunprimentos.
Caro Filomeno,
Uma entrevista de dois homens de alta qualidade interessaria aos dois. Cada um tem muito que aprender com o outro. Cavaco, no dia 5 de Outubro, fez um discurso muito interessante, ao fazer o diagnóstico da situação de Portugal e ao alertar para os pontos essenciais a precisar de medidas adequadas.
Dadas as limitações que a Constituição lhe impõe, considero que foi uma intervenção brilhante e corajosa.
Abraço
João
Caro Miguel,
Agradeço o desabafo.
É possível que tenha deixado passar essa ideia, mas não é por intenção.
Não gosto de ser agressivo nem de usar linguagem menos própria, mas procuro dizer o mesmo que outros dizem, mas de forma mais suave.
Na frase «nenhum responsável credível emite afirmações coerentes e sustentadas que inspirem tal calma. O que dizem hoje não confirma o que disseram ontem e não será confirmado amanhã.» e noutras semelhantes vai um recado para o responsável máximo. Num comentário recente, disse que na política se deve aplicar o princípio das unidades militares em que «o comandante é responsável por tudo o que a unidade faz ou deixa de fazer.»
No post actual, quis salientar a quantidade de assessores nomeados por critério de confiança politica e não por competência. Concordo com Pacheco Pereira quando diz que os asessores aumentam o tráfico de influências e, neste caso, certamente o Magalhães e a ocultação do processo fiscal foi obra de um assessor amigo da empresa fornecedora, o que não quer dizer que não tivesse havido conivência de algum secretário de Estado, da ministra ou mesmo do PM. Tenho também falado na falta de coesão da equipa, em que são frequentes decisões orientadas para sentidos opostos, a que se sucedem recuos.
Falta um «treinador» da equipa com valor semelhante ao de Scolari! Mesmo que se diga mal de um membro do governo, a crítica atinge o PM, por ter sido ele o seleccionador e é ele o orientador permanente e é ele que tem autoridade, assim tenha coragem, para substituir um elemento com fraco desempenho. etc, etc.
E a estes pontos posso juntar que, muitas vezes uso de ironia, em que por detrás de um «elogio» esconde-se, para o leitor atento, uma crítica feroz.
Abraço
João
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