De médico e de louco todos temos um pouco. Atrevo-me, por isso, a utilizar uma analogia entre as relações internacionais e a medicina. Um médico não se limita a fazer desaparecer os sintomas, que são considerados como avisos, sinais de que algo está mal, mas analisa-os com a intenção de chegar às suas causas, que é a essência do problema ao qual é necessário aplicar a terapêutica mais adequada para ser eficaz. Mas esse é o método de trabalho de quem teve uma formação específica profunda e demorada e que nunca deixa de estudar a fim de se manter actualizado, a par das mais modernas inovações da ciência e da técnica.
Com os políticos não se passa o mesmo, dada a ausência de preparação para as funções e a sua conhecida aversão ao estudo sério e consequente, de onde resultam demasiadas hesitações e erros que provocam avanços e recuos, com variados e pesados custos para o erário, que podiam e deviam ser evitados.
Hoje os jornais trazem notícias do Darfur, do Iraque, do Afeganistão e do Kosovo. São pontos do globo com crises graves que estão a utilizar forças militares em grande quantidade e cuja pacificação fica para muito além do horizonte não se vislumbrando uma data final da normalização. A impreparação dos políticos e a sua miopia acentuada, tem resultado na aplicação da força armada para combater os sintomas, sem terem capacidade de análise serena das causas, isto é da essência do verdadeiro problema, daquilo que está em jogo. O efeito obtido traduz-se em indescritíveis destruições de património material, histórico, arqueológico que faz falta à cultura da humanidade e, o que é mais criminoso, a mortes de imensas pessoas inocentes e inutilização de muitas outras cuja vida passa a ser apenas sofrimento e revolta.
Em vez da confrontação armada, teria sido mais avisado sentar à mesma mesa representantes das partes em conflito e levá-las a analisarem calmamente os interesses em jogo com vista a chegarem a um acordo que fosse aceite por todos. Dessa forma, os representantes dos povos abrangidos pela crise, actuariam democraticamente, através dos seus delegados, para a construção do melhor futuro possível para todos. Mas, a «comunidade internacional» ignorando o espírito democrático, assalta o País e impõe, de cima para baixo, pela força das armas, a solução que nenhuma das partes quer. E passam-se anos de morte e sofrimento sem nada se obter de melhor para os povos.
Para ilustrar estas palavras basta observar o que se tem passado e continua a passar-se em cada uma das regiões atrás citadas, mas tem de ser uma observação o mais possível imparcial, sem preconceito, sem dar previamente razão aos «bons» ou aos «maus», sem chamar rebelde e terrorista a qualquer das partes. Quantos países se formaram à custa de muita luta em que foram apelidados de terroristas? E dos terroristas e rebeldes de hoje quantos virão a ver coroadas de êxito as suas lutas que só existiram por não ter havido uma negociação serena das suas pretensões? Quem melhor do que a população local pode gerir os interesses do Darfur, ou do Kosovo, ou do Afeganistão? Será mais democrático, e mais eficaz a imposição da «ordem» por militares estranhos à região?
Não me refiro a uma ajuda às forças locais para elas poderem manter a ordem pública, em benefício de toda a população e não de apenas uma das partes em conflito, mas tendo por base o resultado de negociações directas entre os interesses em luta. Essa ajuda, esse reforço das forças locais, numa acção humanitária conduzida localmente, sem impor os interesses estranhos, será conveniente.
Parece utopia? Parece irrealista? Mas as lições da vida mostram ser conveniente que os objectivos estejam um pouco acima daquilo que é vulgar e normal. Só assim se avança para a inovação e criatividade e se cria desenvolvimento.
A Decisão do TEDH (396)
Há 1 hora
1 comentário:
Caro A. João Soares,
Identifico-me com a sua análise e com as suas propostas. Esse mundo "utópico" que refere devia ser uma realidade. Contudo, as organizações internacionais credíveis, capazes de concretizar esses objectivos, foram desprovidas de meios e de força. Tal é o caso da ONU: o maior devedor desta organização são, nem mais nem menos, os Estados Unidos...
Enquanto o sistema neoliberal vigorar, com as costas bem quentes, será muito difícil o recurso exclusivo à via diplomática, lamentavelmente.
Um abraço amigo
Contracorrente
Enviar um comentário