Transcrição de post publicado por Paulo Gorjão no blog Delito de Opinião em 02.04.10, seguido de nota.
«Guiné-Bissau: Primeiras impressões
Numa altura em que ainda escasseia informação segura sobre o que se passou -- e ainda está a passar, apesar da aparente reposição do statu quo ante -- em todo o caso há já alguns dados a emergir que permitem especular e tentar interpretar os acontecimentos de ontem e hoje. Vamos por partes.
1. Aparentemente, assistimos a uma tentativa de golpe de Estado que visava demitir o Primeiro-Ministro, Carlos Gomes Júnior, e o CEMGFA, Zamora Induta.
2. Se no primeiro é claro que o golpe falhou, no segundo continua em aberto o desfecho.
3. O que explica o timing de curto-prazo do golpe? Não sabemos.
4. O que explica o timing de médio e longo-prazo do golpe? Muito provavelmente, a Reforma do Sector de Segurança (RSS).
5. Ou seja, o golpe é muito possivelmente uma resposta à RSS e ao novo equilíbrio de poderes que iria emergir no âmbito das Forças Armadas. Possivelmente, ao abrigo da RSS, Induta estaria a preparar-se para consolidar o seu poder em detrimento de outras facções militares. Daí, possivelmente, a resposta de António Indjai, vice-CEMGFA, ele que assumiu a liderança interina das Forças Armadas e que parece ter sido conjuntamente com Bubo Na Tchuto o líder do golpe.
6. Desconheço se existe um elemento étnico no power play em curso. Existirá, seguramente, mas quão relevante o seu peso é para mim uma incógnita.
7. Tal como não é para mim claro a relação de forças entre Indjai e Na Tchuto e o grau de envolvimento de um e de outro -- e, eventualmente, de terceiros.
8. A RSS parece-me a variável central nestes acontecimentos e desvalorizaria outras de que por vezes se fala, nomeadamente o tráfico de droga.
9. No meio disto tudo, algumas questões: Sem a libertação de Induta, pode dizer-se que o golpe falhou? Assumindo que Induta vai ser libertado, em que pé fica a RSS? Indjai vai continuar no cargo? E a comunidade internacional, nomeadamente a ONU e a UE, mantêm o mesmo nível de empenho no processo?
10. Eis algumas questões ainda a carecer de resposta no meio do turbilhão ainda pouco claro dos acontecimentos em curso.»
NOTA: Felicito o autor pelos conhecimentos evidenciados e pela análise serena e isenta que apresenta à reflexão dos leitores.
Por não sentir apetência pela actividade partidária nem querer tomar parte em tricas e baixas lutas pelo poder, habituei-me há muitos anos a olhar com respeito para os interesses nacionais, aqueles que os políticos colocam de lado, em submissão aos interesses pessoais e dos partidos. Por isso, estes acontecimentos vêm confirmar a impressão de que:
a- na política real, predomina a falta de sentido de Estado, a ambição pessoal e a ausência de ética na generalidade dos políticos;
b- nas tricas e lutas partidárias, o povo, para quem deve ser dirigida a governação, é ignorado, desprezado, num papel semelhante ao do mexilhão (que sofre quando o mar bate na rocha) e ao da relva dos estádios (que é pisada sem a mínima compaixão pelos jogadores de futebol);
c- em vez de conjugação de forças e de recursos nacionais para atingir objectivos superiores e a largo prazo de desenvolvimento e modernização, nos países mais atrasados, aparece erradamente a prioridade dos golpes, no vício da desobediência, na ausência de civismo e de respeito pelas instituições;
d- Em toda essa violência e outras ilegalidades e imoralidades praticadas pelos políticos, raramente aparecem condenações, se o lesado for o Estado (o património colectivo), correspondendo a denominada responsabilidade política a uma espécie de criminalidade impune;
e- Das mudanças obtidas por golpes e revoluções, mesmo que feitas em nome dos interesses do povo, só resultam benefícios para a facção vencedora, e o povo continua mais ou menos na mesma. É como as prostitutas quando mudam de chulos, continuam a ser prostitutas mas passam a entregar o dinheiro a outro «protector». Por exemplo, que benefício resultou da independência obtida por Afonso Henriques, das guerras do Nuno Álvares Pereira, e da Restauração de 1640, para as mulheres alentejanas de hoje que têm de ir dar à luz a Badajoz ou para os nossos conterrâneos de Valença que têm de ir às urgências a Tui?
Quem ganha com tais mudanças são os políticos do grupo vencedor que estavam na sombra e que passaram para a ribalta colhendo fortuna e mordomias.
Lápis L-Azuli
Há 1 hora
1 comentário:
Ao menos não se preocupam com o PEC.
Boa Páscoa
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