Transcrevo este texto do Professor João César das Neves, recebido por e-mail, que faz pensar nas capacidades do nosso povo para avaliação e análise das prioridades e escalas de valor. Embora dando um desconto a algum exagero literário, fica aqui concentrada uma série de vícios de apreciação que faz meditar no facto de, estando nós numa «espécie de democracia», serem estas pessoas a eleger, com o seu «elevado critério», os dirigentes políticos.
Certamente os líderes da UE, baseiam-se em conclusões como esta para menosprezarem o resultado do referendo irlandês neste regime democrático europeu!
Fumadores!!!
(João César das Neves é Economista e Prof. Universitário)
- Dona Fernanda, então por aqui? Agora me lembro, ainda não lhe dei os parabéns pelo seu homem. Vi-o no concurso da televisão. Que honra! Muitos parabéns! Fiquei orgulhosa como se fosse meu!
- É verdade, dona Cátia. Estamos muito contentes. Foi muito bom, até para compensar a desgraça da minha irmã. Não sabe? Imagine que o marido dela é administrador de um banco.
- Não me diga! Que vergonha! Mas qual? Daquele criminoso, o BCP?
- Olhe nem sei bem. Mas aquilo é tudo a mesma gente. Coitada da minha irmã, anda muito ralada! Felizmente que o amante está muito bem. Era segurança num bar, mas agora conseguiu ficar dado como deficiente por causa de uma sova que levou e o subsídio é excelente.
- Ainda bem! Que sorte! Olhe, essa sorte não tenho eu. Ando muito preocupada com o meu sobrinho. Não, não é com o homossexual. Não, esse está óptimo. Foi ao estrangeiro casar com o amigo e agora até estão a pensar adoptar uma criança por lá. O que me preocupa é o outro, o Zé. Tem um restaurante, imagine. Um restaurante de luxo.
- Ai, coitado! Em que se havia de meter! E tem tido muitas queixas?
- Pois. Calcule que nem sequer usava sabão líquido nas casas de banho e os exaustores são de baixa extracção. Estou com medo que mais cedo ou mais tarde acabe na cadeia, pobrezinho!
- Compreendo, compreendo. As ralações que temos! E então o que é que a traz por cá? Eu vou agora ali à direcção da escola queixar-me. Veja lá que a minha filha me disse que lá na escola não há máquinas de distribuição de preservativos na casa de banho das raparigas. Só na dos rapazes. Não é uma vergonha?
- Um escândalo. Depois se há problemas a culpa é dos pequenos! Eu também tenho de lá ir mas, infelizmente, é derivado ao comportamento do meu Ronaldinho.
- Não me diga que ainda é por causa da gravidez?
- Não, que ideia. Isso está tudo resolvido. Eles os dois trataram a questão com muito bom senso. Nem pareciam ter 13 anos! O aborto correu muito bem e o meu rapaz até já arranjou outra namorada bastante mais velha. Não, o que me preocupa é aquele grupo com que ele anda.
- Qual? A banda de rock satânico? Oh, minha amiga não se apoquente com isso. Nós lá em casa até dissemos ao nosso rapaz para criar uma. Antes isso que andar pelos ATL da paróquia com aqueles beatos a meter patranhas na cabeças dos miúdos. Na banda é muito mais seguro e saudável. Não só é artístico, como abre horizontes e um dia, quem sabe... Olhe, não me preocuparia nada com isso.
- Não, não é isso. Nós também estamos muito satisfeitos por ele andar com a banda. É um excelente meio de educação. Ao princípio ainda me chocavam um bocado as letras das canções, a falar de suicídio e sangue, mas agora até acho graça. Rapazes são rapazes, não é? Não, é muito pior. Ele também anda metido em coisas mesmo graves com aquele outro grupo clandestino. Já ouviu falar, não? Aquele grupo de fumadores que no outro dia até apareceu no jornal por um deles fumar dentro do metro.
- Que horror! O seu filho fuma? Mas isso faz imenso mal à saúde e polui o ambiente. Então ele pensa no aquecimento global? Esta juventude está perdida!
- Eu sei, eu sei! Tentámos tudo para o afastar do vício, mas nada. O meu marido até quis ver se o interessava em blogs pornográficos, chats neonazis e outras coisas que fossem também um bocadinho subversivas e clandestinas mas não fizessem tanto mal. Mas nada! Ele não larga o cigarro! A culpa é do meu homem e eu já lhe disse. Imagine que quando o miúdo era pequeno lhe dava pistolas e outros brinquedos de violência. Claro que tinha de ter esta consequência, não era?
- Que horror! Imagino como anda apoquentada. E nos estudos, que tal anda ele? Os meus,, antigamente, era um castigo. Davam muitos erros de ortografia mas isso agora, com este novo programa para o insucesso escolar, deixou de criar problemas porque já não conta. E, mesmo na Matemática, o que interessa é a criatividade dos miúdos. Se os professores explicam mal que culpa têm os pequenos?
- Eu digo o mesmo. Se eles depois acabam todos no desemprego, ao menos gozem a juventude...
El País
Há 20 minutos
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