As recentes eleições europeias desorientaram os entendidos que tinham fé nos sinais dados pelas sondagens. Além de a abstenção ter reduzido a ida às urnas a menos de um terço dos eleitores, estes mostraram que não se submetem aos palpites de políticos, nem às sondagens nem aos comentadores e dão este sinal de que começam a pensar pela própria cabeça.
O maior e mais nítido sinal de contestação ficou representado por 4,6% de votos em branco, quase o duplo do máximo anterior. Também os 5,3% em partidos sem representação parlamentar devem ser interpretados como falta de confiança nos actuais ocupantes das cadeiras da AR. Mas a grande bomba e que, a repetir-se nas legislativas, pode tornar o País ingovernável é, com efeito, «a soma dos dois partidos centrais, PS e PSD, ter sido inferior a 60%, o que só aconteceu uma vez desde 1974, em 1985, no momentâneo surto do PRD. Há 20 anos que esse valor anda acima dos 70%. Nas últimas europeias foi de 81%, e de 79% nas legislativas de 2005. Desta vez ficou pelos 58%. Desta forma, nenhum dos dois grandes conseguiria maioria absoluta com qualquer dos pequenos. Esta pulverização do espectro partidário faria de Portugal um país ingovernável, segundo defende João César das Neves.
Perante tão preocupante alteração do cenário, o partido do Governo tem de mudar a táctica, mesmo sem ter tempo para poder alterar estratégias, mas mesmo para a táctica dispõe de pouco tempo, com a agravante de dois dos três meses serem de férias, com parte da população dispersa fora dos locais de residência e de trabalho.
O tempo curto obriga a mudanças radicais nos contactos publicitários junto do povo, o que, segundo Aguiar Falcão, pode ter resultados imprevisíveis, pois poderá haver quem, por um lado, considere que tudo soa a falso e quem, por outro lado, acredite que o voto nas europeias já teve o seu efeito" e convém explorar a vitória já obtida.
Efectivamente, o primeiro-ministro já pôs em marcha uma mudança muito radical de postura e discurso mas, mesmo assim, esta pode levar a duas reacções extremas do eleitorado: por um lado, pode tudo soar a falso; por outro, pode-se achar que o "cartão amarelo" das europeias já surtiu efeito. Mas ao Secretário do PS, não resta outra alternativa. Tem de deixar de ser "rígido, prepotente, agressivo e inflexível" e passar a mostrar-se "afável, prudente, dócil e tolerante".
Segundo Pedro Marques Lopes será difícil, depois de quatro anos de governação, alguém poder mudar seja o que for na sua imagem ou na do Governo, a três meses de umas eleições. O povo já começa a estar alertado e aquilo que for demasiado artificial poderá ter como reacção um forte ataque de riso.
Textos consultados:
- Portugal ingovernável?
- Pouco tempo para vingar mudança "radical"
- Demasiado tarde, demasiado cedo
A Decisão do TEDH (398)
Há 22 minutos
4 comentários:
Subscrevo inteiramente e assino por baixo.
Parece que afinal ainda há esperança, pois o povo deu mostras de começar, ainda que timidamente, a sair da letargia em que se encontrava.
O PM está então entre a espada e a parede, já que não é em 3 meses que se consegue apagar uma legislatura. Mas a tarefa é igualmente difícil para todos os partidos, pois estamos a chegar a um limite em que o povo pede propostas e medidas concretas e menos demagogia e conversa fiada.
Vamos torcer para que novos ventos soprem na política nacional!
Caro André Miguel,
Diz o povo que «não há bem que sempre dure nem mal que ature».
Nunca devemos perder a esperança, mas é preciso fazer por ela.
Os políticos devem prestar mais atenção às realidades que influenciam o pensamento do povo e, por consequência, a sua participação como eleitores.
Os políticos deviam ter sessões de formação(!) para aprenderem que têm de merecer os votos e não se limitarem a querê-los e contá-los. Precisam de se convencer que a Política com maiúscula é agir para bem do povo e do País e actuar com franqueza e abertura. Não podem estar sempre a pensar nos seus próprios benefícios, a qualquer preço, porque depois, quando o povo acordar, não terão nada.
Um abraço
João Soares
Caro J. Soares
O “marketing” político do governo não resultou. Os eleitores rejeitaram claramente a falta de coerência das políticas e o estilo arrogante da governação de Sócrates. A recente recomendação do prestigiado e insuspeito “grupo de economistas” para a reavaliação dos megas projectos de obras públicos é um cartão vermelho às opções do governo. O elevado endividamento do País requer que os grandes investimentos sejam rigorosamente avaliados e se aposte apenas em empreendimentos de inegável interesse para o País. O processo de decisão tem que ser alterado. O governo não pode decidir sozinho e encomendar estudos que apoiem a decisão, boa ou má, que tomou. Não se aprendeu nada com a novela da localização do NAL. Os métodos são os mesmos e fazem recordar a polémica adjudicação do Freeport. Este assunto será tema central das Legislativas e influenciará a decisão de votos dos eleitores.
Um abraço
Eurico
Caro Eurico,
Dizes muito bem estas verdades.
Porém, os grandes investimentos são uma lógica do sistema. Repara como é muito claro:
- Os políticos, salvo eventuais excepções, têm como principal prioridade o enriquecimento através da corrupção, de que eles próprios se viram obrigados a falar, mas que não querem combater.
- Todos os grupos parlamentares, sem excepção, votaram a vergonhosa lei de financiamento dos partidos em que o «dinheiro vivo» passou a ter um lugar de Rei.
- O Tribunal de Contas tornou público há poucos dias as derrapagens que acontecem sistematicamente em todos os grandes investimentos, o que começa logo pela aprovação de projectos incompletos e desadequados (o que dá origem às «comissões») e depois cada alteração ao projecto será aprovado à custa de novas «comissões».
- Parece, pois, muito lógico que os governos tenham vontade de massacrar os futuros portugueses com o pagamento de elefantes brancos de que muito beneficiaram governantes, autarcas e outros políticos com poder de influência.
Só não percebe estas coisas quem anda de olhos fechados.
E o povo é desviado para o futebol, as telenovelas e «fait-divers», a fim de não ver isto.
Um abraço
João
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