Transcrevo este texto que recebi por e-mail, de autor sobejamente conhecido pelas suas intervenções nos jornais, na TV e na Internet. Os comportamentos sociais e individuais sempre foram sofrendo (ou beneficiando de) alterações, e sempre houve Velhos do Restelo que mostraram as loucuras dos aventureiros. Porém, a situação que o texto descreve representa uma transformação muito profunda que afecta várias instituições, como a Instituição Militar, de que os Estados ainda não podem prescindir e à qual exigem sacrifícios ilimitados, numa época em que ainda não se vê perspectiva de redução de «hostilidades entre civilizações».
Mesmo que deixe de haver guerras e os conflitos de interesses entre Estados passem a ser dirimidos por negociações directas ou intermediadas, levadas a cabo por diplomatas, estes, para serem eficientes, não podem dispensar nos seus comportamentos regras muito parecidas com os regulamentos militares – dedicação aos interesses nacionais, disciplina, deferência, respeito pelo segredo de Estado, etc. Está em causa um tipo de civismo que merece muita ponderação pelos governantes e educadores.
A bela situação a que chegámos
'O único local em que o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário'
Lema da escola de Karate Shotokan da A.E.I.S.T.
Jornais e televisões ingleses, em passado recente, davam conta das conclusões de um estudo encomendado pelo ministério da defesa britânico mandado efectuar na sequência de se ter verificado a desistência de cerca de um quarto dos voluntários para as forças armadas de sua majestade durante a recruta. O estudo concluiu e o respectivo chefe de estado-maior das forças armadas (CEMGFA), corroborou publicamente, que a dificuldade de retenção dos candidatos a militar (num regime muito louvado de voluntariado puro…), se resumia na dificuldade que os mancebos actualmente têm em 'aguentar' a disciplina castrense. Tal é fruto da evolução da sociedade, que faz com que os jovens cheguem à idade adulta sem qualquer tipo de organização mental, hábitos de trabalho, disciplina de vida, referências morais sedimentadas, nem dispensarem uma panóplia variada de cómodos e artefactos de diversão (por ex, terem um toca CDs no quarto), e reagirem muito mal a que se lhes eleve a voz. E afirmava pesaroso o CEMGFA (nós ouvimos): 'os jovens chegam até nós, sem qualquer tipo de respeito ou deferência…'. E acrescentava, que dadas as facilidades actuais, jovem que se aborreça na recruta, telefona para casa (por telemóvel obviamente) e a sua mãezinha vem de imediato buscá-lo!
E por isto tudo, o relatório recomendava que se abrandasse a disciplina, facilitasse a vida aos recrutas, se melhorassem um certo número de instalações e da parafernália electrónica e, 'last, but not least', se melhorasse o acesso aos preservativos alargando generosamente a distribuição das respectivas máquinas! No fim, o malfadado general (mais um a fazer o frete…), sossegou os seus concidadãos afirmando que tudo se iria fazer para que o produto acabado, não perdesse a qualidade. Presume-se, é bom de ver, com a ajuda do Harry Potter!
Ora aqui temos mais um exemplo desta desgraçada civilização ocidental, desta vez pela mão da velha 'albion', que dispõe (ainda) de um dos melhores exércitos do mundo e onde se suporia habitarem mentes mais atinadas. É que, de facto, e lamentavelmente o relatório em vez de apontar as causas profundas e bastas que levaram a este estado de coisas e os remédios para as mesmas (que são da responsabilidade de todo o governo e não apenas do ministro da defesa), se limita a constatar com fatalidade a triste realidade e a propor acções sobre os efeitos. O que só irá agravar as causas e afastar para as calendas gregas a resolução dos problemas. Daqui a pouco tempo surgirá outro estudo a propor qualquer coisa do género: quartos para unidos de facto; casas de banho para homossexuais, heterossexuais, transexuais, mistas, bi e outras que se inventem; camarões grelhados para o lanche; shows de 'strip' antes do recolher; massagens após a instrução de 'aplicação militar' (leve); intervalos obrigatórios nos exercícios, para o pessoal poder telefonar à namorada(o) etc. Um etcetera que apenas encontrará limites na degradação da coluna vertebral (vulgo carácter) dos envolvidos e, claro, no dinheiro disponível. Todavia pensamos, que tudo isto só se irá inverter quando houver um susto grande e se, nessa altura ainda houver capacidade de reacção. O assunto é grave e não se limita a um ou dois países: vai do atlântico aos Urais e por isso é de muito mais difícil resolução. É uma espécie de fim do império romano, que acabou por cair quando os cidadãos romanos deixaram de querer defender a cidade e contrataram 'bárbaros' para protegerem as suas fronteiras. Os bárbaros, ao fim de algum tempo, e já que estavam lá dentro, acabaram por tomar a cidade. Quando uma qualquer tribo aguerrida de 'tártaros' se aperceber deste estado de coisas e chegar à fronteira, bastar-lhes-á levantar a cancela (se esta ainda existir ou não tiver sido aberta antes), e tomar conta de território e populações, sem disparar um tiro. É, apenas, uma questão de tempo.
João José Brandão Ferreira, Tcor Pil Av (r)
El País
Há 48 minutos
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