Recebi um e-mail de um amigo «virtual» que achou que podia desabafar comigo as suas preocupações e angústias acerca do mundo que «caminha para o caos total». A sua sensibilidade coloca-o em grande «depressão» ao prever «grandes convulsões e sofrimentos sociais e humanos», sem ver capacidade nos poderes instalados para resolver os «grandes problemas nacionais e globais». Para ele, o desrespeito pelo voto Irlandês equivale ao fim do efeito da liberdade de expressão, e à perda de protagonismo dos povos. Também teme que o aumento da tensão com o Irão possa desaguar em outro conflito como os que já existem na zona. Como ele, poderá haver mais pessoas a deixarem-se dominar por um pessimismo que pode ser prejudicial à saúde, e assim permite que refira aqui estes tópicos e a resposta que lhe dei por, na sua opinião, poder ter efeito positivo em pessoas em igual situação depressiva.
A minha resposta:
Agradeço a sua confiança em mim e o desabafo que me entrega e, mesmo não sendo psicólogo nem sociólogo, vou dizer-lhe algumas ideias sobre os pontos que refere. Compreendo a sua situação e espero que a sua «depressão» não seja uma coisa grave que esteja a colocar em dificuldade o seu equilíbrio mental. Pense em si, porque, para si, nada há mais importante do que a sua pessoa. Quando dizemos que devemos gostar dos outros como de nós próprios, parte-se logo do princípio de que devemos começar por gostar de nós próprios, como ponto de referência.
O que vou dizer-lhe é a minha posição pessoal perante a vida, uma filosofia que tenho desenvolvido durante os tempos e com a qual me tenho dado bem, não a obter riqueza material, mas em manter uma paz interior que me agrada. Não levo a vida tão a sério que me tire o sono. E quando isso me acontece, procuro depressa regressar ao ponto de equilíbrio. Nada merece a nossa instabilidade psíquica.
O mundo está mal, sem dúvida, e não paro de o dizer, mas reconheço que não sou eu que, contra a vontade de todos, o vou mudar. No entanto, não desisto de fazer tudo o que posso para que os outros seres humanos pensem no problema e façam o que estiver ao alcance de cada qual para tornarmos melhor o ambiente, físico, ecológico, social, emocional.
As guerras são um dos muitos aspectos da loucura humana, já o tenho afirmado em muitos posts dos meus blogs (que julgo valer a pena ler), sugerindo que as conversações e negociações resolveriam os problemas de forma mais barata em recursos e vidas humanas e evitariam os ódios e desejos de vinganças que, após a guerra, continuam a azedar as relações entre as partes que se digladiaram.
Mas, na realidade, a história é feita de guerras. No meu tempo da instrução primária, o que se estudava da História eram principalmente as datas das batalhas. Mas o mundo tem-se tornado menos guerreiro, pois no século passado houve apenas duas guerras, a I e a II Guerras Mundiais, e depois da última, quase vivemos em paz, embora não deixassem de aparecer pequenos conflitos aqui e acolá, todos localizados. Portanto, o mundo tem melhorado, os filósofos da paz têm sido ouvidos. Não se esqueça que na Europa, nos séculos passados, houve guerras quase em permanência sendo conhecidas a guerra dos cem anos e a guerra dos trinta anos.
Quanto a liberdades das pessoas, apesar de tudo e das muitas queixas, hoje somos muito mais livres de fazer a vida que queremos e dizer o que pensamos do que nos tempos dos nossos avós e bisavós e por aí atrás. Agora temos a democracia, embora ela não seja o que idealizamos, e está na mão do povo usar as liberdades que tem, para pressionar os governantes no sentido de melhorar o sistema político, ao ponto de haver mais justiça social e menos desigualdades na distribuição dos recursos. Em séculos passados, na Europa, havia os nobres, os comerciantes e os servos da gleba que não eram muito diferentes de escravos e que representavam a maior percentagem da população. Eram grandes e muito discriminatórias as diferenças.
Hoje, temos muito poder, como tem visto naquilo que as manifestações conseguem, obrigando o Estado a recuar nas suas decisões menos correctas. Conclui-se que seria bom que o povo reagisse mais, fosse menos apático, e utilizasse o poder que a Constituição lhe concede. O maior mal da nossa sociedade actual é o desinteresse das pessoas, a sua indiferença, a acomodação e a aceitação dos abusos do poder. E é preciso ter sempre presente que a liberdade, quando não é usada, deixa de ter sentido, deixa de ter significado, deixa de existir. Faz lembrar o caso da águia que tendo vivido muito tempo em cativeiro, quando lhe é aberta a porta da gaiola, fica por ali perto, não voa para longe, não sabe aproveitar a liberdade, acabando por não ser realmente livre.
Quanto ao perigo de guerra no Irão, não estou tão receoso como o amigo. Ninguém ataca um país que disponha da arma nuclear, como se viu na tensão de há poucos anos com a Coreia do Norte. No caso desta, as negociações foram esvaziando, lentamente, a pressão e evitou-se a guerra. Agora espero que aconteça o mesmo. O Irão tem tradições de bom senso desde os tempos dos Imperadores Ciro e Dário, sabendo conseguir a convivência entre povos de várias proveniências que ali se encontraram. No momento oportuno saberão dialogar construtivamente, assim tenham da outra parte aceitação do diálogo. Nos tempos actuais, preocupam-me mais as basófias provocadoras do Presidente da Venezuela, Hugo Chávez, que quer deixar de vender petróleo a quem não lhe fizer as vontades! E o petróleo, como estamos a ver nesta crise, é uma arma poderosa que pode desestabilizar dramaticamente todo o mundo, sendo os mais prejudicados os povos que já têm enormes dificuldades para sobreviverem.
A guerra do Iraque aconteceu por um erro de avaliação, ou uma acumulação de falhas e acasos. Poderemos falar nisso noutra altura. Mesmo assim, é apenas uma guerra localizada, embora terrível para as populações e o património material e histórico da região que foi o berço da História, a Mesopotâmia.
Para terminar, permito-me dar-lhe o conselho de não viver demasiado preocupado com os problemas cuja solução não depende totalmente de si. Use a táctica dos médicos que, embora devam tratar da melhor forma os doentes, não os consideram seus familiares ao ponto de se sentarem emotivamente a seu lado e chorarem, em vez de os medicarem racionalmente com esperança de os curarem mas sem sentirem grande desgosto quando morrem.
Os seres humanos têm muitos defeitos de fabrico, o que conduz a situações desagradáveis que nos podem colocar os nervos em franja, mas é nesta sociedade doente que temos que viver, e precisamos da serenidade adequada para analisarmos os factos com calma, estabelecermos prioridades e não desperdiçarmos esforços inutilmente, evitando emotividades que só prejudiquem o nosso psíquico.
Espero tê-lo ajudado a acalmar o seu espírito preocupado, e a evitar tornar-se muito infeliz com a porcaria deste mundo!
A Decisão do TEDH (397)
Há 2 horas
1 comentário:
Amigo A. João Soares
Obrigado pelos seus conselhos e palavras de bom senso que apaziguam, qualquer espírito inquieto, como muitas vezes anda o meu.
Um abraço cordial
Carlos Rebola
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