A crise está presente na vida dos portugueses mais desprotegidos. Está aí instalada. Nos transportes públicos e em todo o lugar onde se juntam pessoas, nas filas de espera, são ouvidas queixas das dificuldades da vida com os sucessivos aumentos dos preços de produtos essenciais. Os cafés, pequenos restaurantes, supermercados e lojas de pequenas dimensões lamentam-se da falta de clientes e da redução do valor das facturas. São abundantes as notícias sobre as dívidas e as dificuldades em as pagar. No entanto, há uns poucos que não se privam de nada e parece sentirem prazer em ostentar o seu poder financeiro para convencer que está muito acima da normalidade e são imunes à carestia da vida.
No artigo «Dicas para enfrentar a crise no seu bolso» (ler aqui) a jornalista Paula Cordeiro, apoiando-se no site Saldo Positivo, da Caixa Geral de Depósitos (CGD), indica quatro passos a seguir para contornar o aumento das despesas, como reduzir dívidas e aumentar poupança, a fim de evitar que o endividamento atinja proporções dramáticas.
Essas dicas estão descritas sob os seguintes títulos:
- Saiba quanto deve e que taxas de juro está a pagar
- Defina as suas prioridades na hora de pagar
- Analise se o crédito está a estragar-lhe a sua vida
- Algumas decisões mais difíceis para poupar
Mas o «homo sapiens sapiens» português, por não ter beneficiado de um ensino eficaz para gerir a sua vida privada, não consegue destrinçar o essencial do secundário, não sabe definir prioridades, nem planear o futuro emprego dos salários que recebe, acabando por enigmaticamente se afundar em situações de que lhe é difícil sair.
E os enigmas chegam a atingir efeitos de proporções chocantes como a descrita no artigo «Crise é um acessório que não se usa aqui» (Ver aqui), em que a jornalista Mariana Correia de Barros nos fala de uma loja de modas da Baixa de Lisboa, em que se chega à conclusão de que «o mercado do luxo, ao contrário de outros, está a viver dias de crescimento. Roupas e acessórios de luxo escapam à crise. Há até listas de espera».
A crise parece não afectar os bolsos de todos os portugueses, dizendo o administrador da loja que "o luxo começa quando a emoção ultrapassa a razão", perante a sua observação de que o luxo é sumptuosidade, extravagância e exclusividade, constituindo razões mais do que suficientes para comprar, para aqueles a quem a crise parece não ter batido à porta.
Diz o mesmo empresário que o mercado de luxo está florescente como é evidenciado pelo aparecimento de um crescente número de lojas de artigos de grandes marcas em Portugal.
Mas aquilo que se passa com o consumismo em que a emoção se sobrepõe à razão, atinge também as mentalidades dos governantes, como é o caso da notícia «Ministério da Defesa ganha Mercedes avaliados em 140 mil €» (ler aqui), em que, apesar de o ministro das Finanças ter congelado o plano de renovação da frota automóvel das Forças Armadas, de faltar dinheiro para a manutenção dos modernos helicópteros e das restrições de que se queixam os ex-combatentes, autorizou a compra de dois Mercedes para o ministro da Defesa e para o secretário de Estado da Defesa.
As novas viaturas, de marca Mercedes, custam quase 140 mil euros e vão substituir o Mercedes 220 de Severiano Teixeira e o BMW 520 e João Mira Gomes.
E não são apenas estas as despesas «urgentes» e sumptuosas de organismos do Governo.
O cérebro do homo sapiens sapiens apresenta aspectos muito enigmáticos. Mas, utilizando a frase do empresário atrás referido, o cérebro não funciona, pois são casos emotivos de sumptuosidade, extravagância, exclusividade, vaidade, arrogância, ostentação, assentes numa base de falta de respeito pelo dinheiro público. Veja-se no post «Crise não significa Apocalipse»….. os excessos de despesas de muitas Câmaras, a comprovar essa irresponsabilidade da gestão pública.
Apesar do esbanjamento ou talvez devido a ele, há casos como o referido hoje no Público no artigo «As carências Unidade Especial de Polícia sem dinheiro para comprar fardas» de José Bento Amaro.
"Cancelamentos culturais" na América (4)
Há 4 horas
15 comentários:
Este governo já está fora da validade há imenso tempo.
Estamos em crise, há pessoas que passam fome, e os governantes da defesa compram carros novos.
Não admira, Portugal tornou-se numa república de/das bananas...
Um abraço
Compadre Alçentejano
Caro Compadre,
Não seja tão radical. Os portugueses tão têm muita razão para estar descontentes. Estamos a viver muito bem. Não há miúdo da família dos governantes e ex-governantes que não esteja encaixado num tacho à nossa conta. Os assessores são mais do que muitos e nada fazem, nem sequer evitam que os seus chefes façam asneiras de que são obrigados a recuar face às manifestações do povo. Quando esses chefes precisam de estudos ou pareceres vão contratá-los fora, a sociedades de amigos, políticos em funções ou já fora delas. Repare naquele advogado pago pelo ME para fazer um trabalho e não o fez e, em vez de ter sido obrigado a repor o dinheiro que recebeu indevidamente, ficou com ele e teve um novo contrato a preço muito superior para fazer o mesmo trabalho que não soube fazer no prazo do contrato anterior.
Onde estão os ex-governantes e ex-deputados? quanto ganham?
Não há só o apito dourado, há também os «tachos dourados» que são apenas para os beneficiados pela politica.
Portanto, vistas as realidades nacionais pela óptica de quem está nesse grupo de beneficiados, o País está maravilhoso, ganha-se bem, têm-se muitas regalias, etc. Um exemplo: O patrão do Banco de Portugal ganha mais do que o seu equivalente dos EUA!!! Estamos muito bem, Portugal é um País rico, desenvolvido, de gente feliz a viver desafogadamente. Temos o melhor nível de vida da Europa, etc.
Crise? Aumentos de preços? Mentira. Está tudo muito bem e proporcional aos aumentos das pensões!!!!!
E o caso referido do MDN é apenas um entre muitos. Na Justiça, houve não só substituição de carros dos governantes e secretários mas também dos Juízes do supremo.Eles não sabem o que o bom povo sofre, mas o bom povo sabe quanto eles gozam e um dia isto pode estoirar. Os camionistas já levantaram uma ponta daquilo de que são capazes.
Um abraço
A. João Soares
Caro João!
Esta sua resposta é a certa!
É que é assim mesmo que pensa, quem está bem!
Aliás até dizem que nunca houve tanta abundância e facilidades para se trabalhar como agora. Temos tudo para haver felicidade... é assustador como pensam esta escumalha que manda!
E depois há uns quantos que estão mais ou menos mal e que dizem mal, mas se pudessem estar no poder ou nesses lugares, fariam exactamente igual. E vê-se... As pessoas vendem-se como muita facilidade, o dinheiro é tudo! E depois ninguém quer ser pobre. É a pior das doenças. E vá de se roubar legalmente.
E não há volta a dar, enquanto se mantiver esta forma de se governar numa completa ausência de valores éticos, a só prevalecerem os valores baseados nas corriqueiras e hipócritas moralidades, isto irá com certeza acabar mal.
Cumprimentos
Alice
Alice,
Concordo consigo no que se refere à falta de valores éticos, de moralidade, de sentido da honra e das responsabilidades. Mas gostaria de não concordar quando diz que «não há volta a dar». Tem que haver uma volta, tem, que se inverter esta queda para o abismo. Há que parar a queda e recuperar. Isso tem sido feito em muitos Países como, por exemplo, na Irlanda agora tão falada. A Irlanda estava junto de Portugal nos Países mais pobres da Europa ocidental e agora tem um PIB duplo do nosso, menos desemprego e com outros indicadores mais positivos. Há Países do Golfo Pérsico que, antevendo o fim da era do petróleo estão a reconverter a economia para o turismo e os serviços com grande incidência da informática. E Portugal que faz com vista ao futuro? NADA. Apenas pensam miudinho nas tricas para manter o poder, denegrindo os da oposição, e fazendo propaganda para manter o povo na ignorância.
É imperioso que se dê a volta a esta miséria moral e social. E tem de se começar pelo ensino, pelo aproveitamento dos estudantes mais capazes e dar-lhes o apoio que merecem para serem os impulsionadores da mudança, pacífica e positiva.
Cumprimentos
João
Sim concordo consigo, que há que alterar, mas somos muito poucos. É que isto está minado demais.
Quando eu refiro que não há volta a dar, é relativo às mentalidades de um grupo de incompetentes e incapazes que têm vindo a saquear o país de uma forma assustadora, e são já, mais que muitos! E como fazer para alterar, só com um susto grande!
E às vezes, pergunto, mas será possível estarmos como estamos... sem vislumbrar nada de novo.
É creio ser no ensino sim, que se tem de se começar, e até tenho escrito sobre essas possibilidades de uma forma algo optimista.
Um abraço
Cara Alice,
Minha amiga, nem somos poucos nem muitos. Somos o que somos, e é assim que temos de nos defender.
O ensino é realmente a via mais eficaz, mas é demorada, sendo aconselhável agir por todas as formas e já. O futuro começa agora, não podendo ser adiado nada que deva ser feito.
O povo tem muito poder, como temos visto naquilo que as manifestações conseguem, obrigando o Estado a recuar nas suas decisões menos correctas. Conclui-se que seria bom que o povo reagisse mais, fosse menos apático, e utilizasse o poder que lhe é dado. O maior mal da nossa sociedade actual é a apatia das pessoas, a sua indiferença, a acomodação e a aceitação dos abusos do poder. A liberdade, quando não é usada, deixa de ter sentido, deixa de ter significado, deixa de existir. Faz lembrar o caso da águia que viveu muito tempo em cativeiro e, quando lhe é aberta a porta da gaiola, ela fica por ali perto, não voa para longe, não sabe aproveitar a liberdade, acabando por não ser realmente livre.
O povo está adormecido e o poder quer mantê-lo assim com a propaganda constante e com motivos de distracção que lhe desviem a atenção daquilo que é realmente importante.
O seu papel e o meu, no mínimo é contribuir, dentro das nossas possibilidades, para que as pessoas acordem e passem a pensar por si, usando a sua capacidade de raciocínio.
O primeiro passo é estar informado. Mesmo que a informação que nos chega seja insuficiente, temos de pensar nela e tirar conclusões. É preferível errar do que ficar atado sem nada fazer. «O caminho faz-se caminhando». As crianças para aprenderem a andar caem muitas vezes e levantam-se e voltam a tentar. Porém convém que cada passo seja o mais correcto possível. Devemos procurar errar pouco, mas não ter medo de arriscar.
Um abraço
A. João Soares
Num país que se caracteriza pelas assimetrias sociais, e portanto de rendimentos, já nada nos admira. Os que comem tudo dão-se ao luxo, os outros (a grande maioria) tentam sobreviver, com salários miseráveis, quando não são desempregados ou pensionistas o que ainda é pior.
Os governantes, bem sobre esses estamos falados, com a incompetência que os tem marcado, já deviam ter ido para a rua, se tivessem alguma vergonha na cara.
Cumps
João,
Basta dar uma volta pelos locais ditos de luxo da nossa capital, para perceber que os ricos estão cada vez mais ricos. Se isso acontece, é porque o dinheiro tem que vir de algum lado, porque que eu saiba ele não nasce.
Abraço.
Caro A. João Soares
Penso que há um grande número de cidadãos não contabilizados (sentem vergonha em se manifestar) que por mais que se forem a reduzir o consumo têm que o fazer nos medicamentos e alimentação e essa postura significa uma morte rápida ou lenta o que ainda é pior.
O amigo Arsénio Mota (http://arseniomota.blogspot.com/2008/06/mundo-velho-x-mundo-novo.html) no seu último post retrata muito bem esta dualidade entre o mundo velho e o mundo novo que se deve impor.
Um abraço amigo
Carlos Rebola
Caro Guardião,
Bem observado. É por isso que, já que a Comunicação social se cala em conivência com o Poder actual, os bloggers devem chamar a atenção para, as injustiças sociais existentes, a fim de despertarem os cidadãos adormecidos ou anestesiados pela propaganda. Quando cada um pensar pela própria cabeça em vez de ir atrás do canto das sereias dos políticos, estarão cridas condições para a intervenção democrática.
Um abraço
A. João Soares
Caro Art of Love,
Não frequento esses locais, mas compreendo o seu espanto. O poder de ostentação vê-se nos carros de alto preço que nas imediações da minha vasa estacionam nas ruas.
O dinheiro até pode vir de forma legal, aliás os dinheiros dos que estão ligados à política é sempre legal. Eles fazem as leis à sua medida!
Mas o funcionamento da sociedade faz que os pobres sejam mais afectados pela crise, o mínimo aumento de preços coloca-os logo com dias a mais no mês.
E há os grossos ordenados dos assessores que nada fazem, os «tachos dourados», as «reformas milionárias», para não falar no «apito dourado», no tráfico de influências, no tráfico de droga, na fuga aos impostos, na economia paralela. Assim, de repente, saiu uma lista que comprova a incapacidade do Poder para combater as injustiças sociais e a má distribuição do PIB!!!
Quem é que tem poder para resolver isto e não resolve?
Porque não resolve?
Onde estão as propostas do deputado João Cravinho quanto ao enriquecimento ilegítimo e a corrupção?
Quais os interesses que impediram que não tivesse ainda surgido legislação e medidas concretas nesse sentido?
Se estivéssemos num País a sério, governado por pessoas dedicadas aos interesses dos cidadãos vulgares, não seria necessário estarmos aqui a falar disto.
Abraço
A. João Soares
Amigo João,
A Irlanda para se desenvolver não fez obras faraónicas, não fez estádios para ficarem vazios, não fez auto-estradas em duplicado, não fez TGVs, não prejudicou a sua agricultura nem as suas pescas! Valorizou o seu Ensino, a sua Saúde, as Condições Sociais do seu Povo! Dessa forma os dinheiros foram todos bem aproveitados e o seu Povo em vez de ter sido "adormecido" foi bem acordado para as realidades actuais.
A diferença está aí! Não houve subsídios para ninguém, houve trabalho e mais trabalho e muita Formação. Lá não há "carreirismo político" ou melhor "carneirismo político", esse "cancro" que tanto nos tem corroído!
Obrigado Luís, por estes esclarecimentos adicionais. Só te faltou referir a mania das rotundas em todo o País! Somos uns míseros que só pensamos em grandezas artificiais, ostentação, endividando Estado e Autarquias em prejuízo dos nossos herdeiros. Houve um chefe que deixou as caves do BdP cheias de toneladas de ouro (o que foi um exagero de sovinice), mas agora há um erro muito pior que é o do esbanjamento e endividamento.
Pobre País, pobre povo que paga com o aperto do cinto que nunca mais se desaperta.
Abraço
João
Recordo-me o que presenciei há quinze anos atrás na Irlanda quando seguia de comboio da vila onde estava até Dublin, em que todas as crianças e jovens que frequentavam o ensino oficial ou particular e sem excepção, todas usavam batas ou fardas. E reparei também que o calçado em sapatos ou botas de quase todas elas eram concertados por sapateiros. E por cá já todos os nosso jovens sem excepção, competiam com roupas e mais roupas de marca...
E fiquei ciente por uma descontraída e firme unanimidade irlandesa, que assim não gastavam dinheiro em roupa.
E depois na cidade de Dublin, existiam muitas muitas livrarias, e variadas especialidades literárias.
A música e as artes eram uma constante. E no final de qualquer jantar em família, na cidade ou em zonas rurais, havia sempre quem tocasse e até dançasse.
Uma enorme alegria que era constantemente enriquecida por hábitos artísticos e culturais tanto em família como em grupo, através de manifestações literários e musicais.. Enquanto que aqui todas as famílias unicamente se sentavam à volta da televisão para se favorecerem distraindo-se.
As zonas rurais e em suas tradições eram imensamente valorizadas.
E por isso não admira nada, enquanto que aqui se ensinava como se ser grande na aparência, lá estavam-se nas tintas para as manias e o consumismo.
Cá, na altura, quando eu falava dos exemplos que aqui enunciei, a maior parte das pessoas riam-se sarcasticamente e com uma certa e irritante superioridade, a justificar a Irlanda ser um país mais pobre do que nós, por não se está a modernizar.
Pois é!
E não resisti a partilhar aqui tudo isto
Um abraço
Cara Alice,
O que nos conta é muito esclarecedor do nosso bacoquismo nacional, um novo riquismo, inepto, próprio de gente sem alma, sem «raça» (no significado toureiro!). à falta de verdadeiro valor servimo-nos de aspectos secundários vistosos, de ostentação que opam a vaidade (qualidade do que é vão).
O uso de bata nas escolas teria o salutar efeito de reduzir a vaidade e a competição no consumismo de vestuário nas crianças. Além de proteger o vestuário, permitia a concentração nos trabalhos escolares se a distracção de invejar a marca do vestuário do outro ou da outra.
A televisão que outrora era uma escola de cultura, saber e comportamentos, hoje é o contrário. A restante Comunicação Social também não ajuda. Concursos de contos, jogos florais, prémios a trabalhos com interesse, nada disso ressalta nas notícias. Há mais efeito de adormecimento dos valores do que incitamento e estímulo aos que se distinguem de forma positiva.
Este nosso bom povo precisa de ser impulsionado para o verdadeiro desenvolvimento. O exemplo da Irlanda tem sido apontado internacionalmente como de grande interesse. Sigamo-lo.
Um abraço
A. João Soares
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