A fim de contribuir para um melhor esclarecimento do tema abordado no post «Outrora, demos novos mundos ao mundo» transcrevo o seguinte artigo do DN de hoje, para o qual se espera que os militares tragam mais comentários do que naquele post, a fim de aprofundar a análise do tema.
Uma reforma mal explicada
Alexandre Reis Rodrigues, vice-almirante na reforma
Um dos objectivos da anunciada reforma na estrutura da Defesa, cujas orientações constam da Resolução do Conselho de Ministros n.º 39, de 7 Fevereiro 2008, é, usando palavras do ministro da Defesa Nacional, "reforçar a capacidade de resposta operacional das Forças Armadas ao novo ambiente estratégico". Este objectivo pressupõe, como é óbvio, que a capacidade actual é considerada insuficiente.
Se a iniciativa se referisse a meios para dar às nossas forças a mobilidade e prontidão que o actual ambiente de segurança exige e que, nos seus actuais termos, não permitem a Portugal observar a meta recomendada pela NATO (40% das forças devem ter condições de emprego no exterior), o assunto ficava esclarecido.
Mas não é disso que se trata: o que a prevista reforma prevê para essa área é a criação de um novo comando operacional conjunto e o reforço das competências operacionais do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA).
Fica, no entanto, por perceber de que más experiências de actividade operacional no passado decorre essa necessidade. Não vejo o que possa ser referido no que respeita à actividade interna, que está limitada ao emprego em missões de interesse público; nem sequer imagino que se queira envolver pessoalmente o responsável máximo pela estrutura militar da Defesa na fiscalização da pesca e busca e salvamento ou tarefas similares de rotina, que, sem razões de queixa, têm, desde sempre, permanecido ao nível dos comandos operacionais dos ramos.
Situações como a da traineira Luz do Sameiro [cujo naufrágio, a 29 de Dezembro de 2006 e a poucas dezenas de metros de uma praia próxima da Nazaré, causou a morte de cinco pescadores] ou outras idênticas, como ficou provado, não tiveram absolutamente nada a ver com deficiências na estrutura de comando operacional das Forças Armadas.
Não vejo, também, como o assunto se possa aplicar a intervenções no exterior; só em caso de intervenção autónoma, fora do quadro da NATO ou da União Europeia, é que as forças se mantêm sob comando nacional. Porém, este tipo de situação, depois do 25 de Abril, só aconteceu uma vez com dimensão e importância política justificativa de envolvimento pessoal do CEMGFA (Guiné, Verão de 1998) e não gerou qualquer recomendação de um novo órgão de comando militar.
Noutros contextos, o procedimento estabelecido implica transferir o comando das forças para a autoridade internacional responsável, ficando para o CEMGFA o papel de acompanhamento do seu emprego, para salvaguardar as condições em que foi feita a atribuição. O apoio logístico é uma tarefa que ninguém defende dever sair das mãos dos chefes de estado-maior dos ramos.
É natural, por isso, a perplexidade com que vários sectores encaram a decisão de despender recursos na criação de um novo órgão de comando operacional que não vem preencher qualquer lacuna ou resolver deficiências nem pode substituir os dos ramos.
Se alguma vez houve dificuldade ou menor rapidez na tomada de decisão do emprego de forças, uma das razões invocadas, nunca esse problema se situou na estrutura militar da Defesa.
O outro "cerne desta reforma", continuando a usar as palavras do ministro da Defesa Nacional, "é o reforço dos poderes do CEMGFA" com autoridade para harmonizar os projectos orçamentais e de reequipamento dos ramos. Convinha explicar o que significa, na prática, este novo tipo de autoridade e sobretudo clarificar porque pretende o Governo abdicar da responsabilidade de assumir o diálogo que lhe cabe ter com os chefes dos ramos, que são os que detêm o conhecimento especializado dos diversos assuntos, sobre as prioridades a observar e o modo prático de as encarar, deixando essa tarefa, contra o que é habitual na maioria dos países, ao CEMGFA.
A Decisão do TEDH (397)
Há 2 horas
4 comentários:
Amigo João Soares
A caminhar assim não tarda que o comando nas forças armadas esteja entregue a gestores privados.
Os ches militares já reagiram, mas puco a meu ver.
Um abraço
Carlos Rebola
Concordo inteiramente com o artigo e sobre ele faço estas singelas reflexões:
- Ao concentrarem no CEMGFA os poderes de decisão em relação aos três Ramos das FA retirando-os dos respectivos Chefes dos Estados-Maiores fazem-no com uma só intenção! É mais fácil arranjar uma marioneta tipo "Yes man" do que 4!
- Assim basta nomear alguém da confiança do governo para esse lugar para se garantir "o quero posso e mando" sobre as FA.
- Por outro lado esta é uma tentativa de responsabilizar o CEMGFA no caso de algo correr mal e o governo poder lavar daí as suas mãos.
- Este artigo de uma forma muito discreta sinto que esclarece bem as miseráveis intenções que estão subjacentes à reforma em causa.Mas, como não temos Chefes à altura todos eles aceitam este estado de coisas, um por vaidade (por pensar que terá mais importância), por subserviência ao poder político(visto poder vir a trazer-lhe vantagens no imediato)e ainda por menos Bom Senso (por não se aperceber o que atrás poderá advir ao aceitar tal desiderato) e os outros três por falta de virilidade, para não dizer outra coisa, e dessa forma irem-se mantendo no "poleiro"!
Tudo isto revela ao que chegámos no que toca aos políticos e à chefias militares. Uma autêntica vergonha!
Carlos Rebola,
Já estivemos mais longe dessa solução. Antes do 25 de Abril, os Presidentes das Câmaras eram quase todos militares, assim como administradores de grandes empresas onde havia dinheiros públicos. Nada disso hoje está em mãos de militares. As unidades militares acabarão num futuro próximo para as mãos e civis, como já aconteceu à PSP e há-de acontecer à GNR. Depois, de entre os muitos assessores, um ou dois serão militares!!!
Os militares são dotados de virtudes com que os políticos não se sentem bem quando se façam comparações. Por isso há que acabar com essas referências. Ninguém gosta de ter ao lado um vizinho mais rico, mais sábio, mais culto. A igualdade nesses casos é conseguida destruindo o que sobressai. A inveja conduz a isso.
Até nos militares os comandantes não gostam de ter um ajudante que seja mais alto do que eles!
Um abraço
A. João Soares
Caro amigo Luís,
No comentário anterior encontras concordância as tuas apreciações. Há falta daquela fruta a que chamas virilidade. Mas para serem promovidos a general, essa é uma das condições. Repara bem à tua volta e verás que os que sempre demonstraram ter coragem de emitir opinião ficaram pelo caminho, por muito sabedores que fossem. Repara na falta de coragem para aqui colocarem um pequeno comentário. Não quero ser indiscreto ao ponto de te dizer o que recebo por e-mail para se desculparem de não comentarem, nem os mais nem os menos «agressivos»! São umas ovelhinhas bem comportadinhas muito obedientes e sem se mexerem muito para não levantarem poeira!!!
Um abraço
João
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