A guerra clássica obedecia a regras respeitadas por ambas as partes, era uma contenda nobre, com cortesia. Não esqueço um texto num livro escolar de Francês dos anos 40 em que o general francês em frente do inimigo inglês, tirou o chapéu, fez uma vénia e disse «Monsieurs les anglais tirer les primiers».
Pelo contrário, as guerras de guerrilhas, nada tendo de regras respeitadas e respeitáveis, nem de cortesia, antes se servindo de truques e habilidades, não são fáceis de vencer por exércitos clássicos, como as invasões francesas verificaram em Portugal, e, recentemente, como os EUA tiveram o desgosto de constatar no Vietname, na Somália e agora no Iraque e no Afeganistão. O regime do Nepal reformou-se antes de as perdas se tornarem incomportáveis e no Sri Lanka o afundamento do País é notório, com prejuízos graves para a economia e os cingaleses em geral.
Vêm estas considerações a propósito da invasão de Gaza por «Uma entrada esperada mas de fim muito incerto», com a declarada intenção de fazer parar os disparos de rockets e mísseis, cerca de 70 por dia, do território palestiniano para Israel. O desenrolar não será fácil e o fim pode ser decepcionante, para a parte tecnicamente melhor preparada.
A população israelita, com vontade de sobreviver aos propósitos do Hamas, apoia a invasão, mas com um misto de manifestação de força voluntariosas e de receio do fracasso inerente a esse tipo de guerras, acredita que «Operação em Gaza vai durar vários dias»
Israel iniciou a sua operação militar terrestre na Faixa de Gaza, como era esperado, uma vez que os ataques aéreos que vinham fazendo não travaram o lançamento de mísseis. Criticada por muitos, sobretudo nas ruas árabes, e recebida em silêncio por muitas das potências mundiais, esta operação é, na óptica de Israel, uma tentativa de esmagar o Hamas e as suas infra-estruturas militares. Do outro lado, o Hamas, que tem declarado querer eliminar completamente Israel, segundo o seu porta-voz avisa que «Gaza será um cemitério para Israel».
Com as intenções repetidamente declaradas de os palestinianos pretenderem a destruição total do Estado de Israel, este tem-se preparado para resistir a tal ameaça, e reage de forma forte, com uma dureza talvez exagerada, mas que considera inserir-se no conceito de legítima defesa, porque actua em resposta a actos bárbaros e desumanos de massacres de população indefesa, em locais de concentração, como festas de casamento, momentos de oração, paragens de transportes, etc., com bombistas suicidas ou com mísseis e rockets.
Com estas motivações aparentemente inflexíveis, o desfecho do conflito não se apresenta fácil. Trata-se de um caso em que, como tenho aqui referido em variados posts, a solução deve ser procurada por meio de conversações, com o apoio de entidades estrangeiras aceites por ambas as partes. A ONU, de quem tudo devia ser esperado em casos semelhantes, mostra-se mais uma vez incapaz de encontrar uma solução adequada e em curto prazo, porque há vidas em perigo, em grande quantidade.
A conflitualidade entre as duas partes, assenta em causas muito complexas a que não são alheias ambições e interesses de Países da região, como a Síria e o Irão.
Localmente, dado que os israelitas são organizados, inovadores e produtivos tendo transformado o deserto em terrenos produtivos em agricultura e férteis pomares, além de uma indústria moderna que lhes torna fácil a defesa, e, ao contrário, os palestinianos e continuam a viver como antes da criação do Estado de Israel, sem sinais de modernização da sua economia e da sua capacidade de sobrevivência, parece que um dos factores de hostilidade é o mesmo da lenda contada no post «O vagalume e a serpente». Um problema de inveja, de detestar um vizinho com quem a comparação não é favorável.
El País
Há 8 minutos
9 comentários:
Oi, João!
Esses conflitos no Oriente Médio são dilacerantes e até, biblicamente, fratricidas, enfim, um sofrer sem fim!
Amigo, fico honrada com a sua visita e aproveito o ensejo para desejar-lhe um 2009 sempre com essa ótima bagagem cultural que nos elucida a cada post.
Abraço carinhoso!!!
Cara Vanuza,
É um prazer ter aqui um sinal da sua visita que muito me honra.
Abraço a uma capricorniana de estimação,
João
Viva amigo A.João Soares,
para reforçar a introdução desta sua postagem dou o exemplo do quadro de Velasquez " A rendição de Breda" onde o humanismo do general vencedor está patente na mão posta no ombro do general vencido. No entanto sobre guerras acho que elas representam a suprema derrota da especie para entender os seus semelhantes. Em meu entender tem origem na ideia da propriedade privada bem patente no mito biblico do Abel e Caim, curiosamente oriundo dos lados onde se passa esta contenda, cuja mentalidade dos adversários me parece estar bem retratada.
Um abraço
António Delgado
Caro António Delgado,
Realmente a defesa da propriedade privada e, em geral, o sentimento de posse, causa muitos desentendimentos.
Na origem da violência doméstica, está muitas vezes esse sentimento, «o meu marido», «a minha mulher», «o meu filho» com a tendência de domínio, de abuso do poder.
Os próprios governantes que «esmagam» os seus súbditos, com a frase «deram-nos o poder e nós agora fazemos o que nos apetecer».
Há dias uma pessoa dizia com ar irado «estão a estragar a minha cidade». O pronome possessivo está sendo usado indevidamente traduzindo um sentimento egoista e exclusivista.
Isto está presente no ódio mortal dos palestinianos aos israelitas que «estão a ocupar o nosso território». Imagine que os portugueses do sul passassem a detestar os minhotos «estes celtas estão a ocupar o nosso território»!
Um abraço
João
Uma coisa é certa: os israelitas querem acabar com os mísseis Qassam e as suas rampas de lançamento, que diariamente são lançados de Gaza para o sul do seu território.
Mas, há que fazer uma limpeza geral. O pior são as vítimas civis, numa zona densamente povoada...
Um abraço
Compadre Alentejano
Caro Compadre,
O título e as passagens que pretendia salientar levariam a crer que a guerra seria prolongada e dificilmente seria ganha pelo poderoso exército contra guerrilheiros muito motivados. A história do último meio século dos EUA demonstra esta visão do problema.
O que agora é muito debatido é a morte de civis, principalmente de crianças, o que é inerente a uma guerra em zona urbana, com perigos ocultos que levam a tiros imprecisos.
Oxalá estas mortes sirvam de motivo para reflexão sobre guerras, exércitos e guerrilheiros por forma a evitar mortes desnecessárias, e encontrar um meio negocial de resolver os desentendimentos.
Não é fácil, porque a guerra vem desde Caim e Abel.
Abraço
João
Nenhum dos lados é tão estúpido que pense que vai vencer a outra parte. Qualquer dos lados é tão estúpido que acha que, semeando o ódio, está a cumprir o desejo do seu deus.
Um abraço invencível
Caro Pata Negra,
Está a pôr o dedo, num grande inconveniente das religiões que se consideram possuir o melhor Deus, o único, o que as torna irreconciliáveis com os seguidores de Deuses diferentes. As guerras de origem em motivos religiosos, contra os infiéis, sempre foram demasiado sangrentas e prolongadas. Actualmente os fanáticos mais aguerridos, obcecados por dilatar a sua fé são os seguidores do Islão.
Mas aqui os pretextos para o conflito, assentam também no sentido de posse, do terreno que, segundo os palestinianos, «não devias ter sido ocupado» por estranhos, nas condições económicas diferentes por haver uma notória diferença de capacidade de inovação, criatividade, organização e produtividade, geradora de riqueza.
Torna-se absolutamente necessário que o mundo tenha uma Organização com autoridade para conduzir os beligerantes ao diálogo, à negociação.
Um abraço
João
As dificuldades que aqui previa estão a tornar-se realidade. O desespero pode levar a violências ainda mais desumanas. O fim é imprevisível. E as opiniões e apoios conseguem agravar ainda mais os ódios ancestrais que estão na origem do problema.
Transcrevo o comentário que coloquei num ouitro blog sobre este caso:
A minha costela pacifista leva-me a olhar para esta guerra de muito longe, talvez do espaço, para não me deixar enredar nos extremismos de uma parte e de outra. Cada um julga ter as suas razões e estas serem superiores às do adversário. As pessoas tomam o partido de um ou de outro e, com os seus comentários e apoios, apenas contribuem para reacender os ódios do passado e projectá-los no futuro. Dessa forma, nunca mais haverá paz no Médio Oriente. Ora, quem respeitar os Direitos Humanos, deve procurar que cessem os atentados e os bombardeamentos e ataques selvagens e se obtenha uma forma de convivência entre vizinhos, que o são actualmente, e ajudar a que todos beneficiem com uma existência em harmonia.
Não é fácil chegar a esse ponto ideal porque todos estão cheios de ódios que alimentam, mas não será impossível, se houver entidades independentes que os convençam à aproximação em vez do conflito.
O melhor que se pode fazer para a humanidade, e especialmente para o Médio Oriente, é emitir opiniões positivas para melhorar a situação e fugir à tentação de recordar os pontos negros da história.
Não devemos deixar que a história, principalmente a sua parte mais negativa, escravize as populações de hoje desgastando-as com raivas e aversões.
Espero que compreendam a minha boa intenção e não se melindrem por não alinhar em radicalismos.
Abraços
A. João Soares
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