De: Cor Manuel Amaro Bernardo
Para o site Portugalclub
A propósito das afirmações de alguns intervenientes deste site sobre Mário Soares e os designados “Crimes Irreparáveis” (leia-se, referentes à dramática descolonização dos territórios ultramarinos portugueses em 1974-1975), como José Pires, desejo salientar o seguinte.
Lembremos que Mário Soares, mercê da ligação anterior a alguns líderes dos movimentos de libertação, se decidiu por uma descolonização rápida e apressada, incluindo em territórios onde não existia qualquer tipo de reivindicação nesse sentido, como era o caso de Timor e Macau. Neste último não foi por diante, porque os chineses não o quiseram naquela altura.
Quanto à vergonha de Timor, já no livro, em co-autoria com o ex-Chefe do EMFA, Coronel Morais da Silva, “Timor; Abandono e Tragédia” (Editora Prefácio, 2000) foi tratado esse tema em relação a um território, onde era hábito haver um respeito enorme pela Bandeira Nacional – nem pisavam a sua sombra…
Agora (na semana passada), o General de quatro estrelas, Silva Cardoso, que, a seguir ao Acordo de Alvor, foi nomeado Alto-Comissário de Angola, em 1975, (posteriormente Presidente do Supremo Tribunal Militar e autor do best-seller “Angola; Anatomia de uma Tragédia”/2000) quando Mário Soares era Ministro dos Negócios Estrangeiros, veio fazer as seguintes afirmações no livro que publicou e lançou na Sociedade Histórica para a Independência de Portugal, “25 de Abril de 1974 – A Revolução da Perfídia” (Editora Prefácio, 2008):
(…) Os descolonizadores estavam tão ocupados com a Guiné, Angola e Moçambique que quase se esqueceram de Timor. Mas em Julho de 1974, o lugar-tenente de Mário Soares visita Timor e é surpreendido por um portuguesismo quase fanático. Aquela população era uma miscelânea de povos, cada um com a sua língua e os seus costumes próprios. O que os une, permitindo-lhes viver em paz, é a veneração que nutrem pela Bandeira Portuguesa e por Portugal. Almeida Santos confessa que ficou estarrecido com a devoção daquelas gentes a Portugal. Ainda em Timor, em Julho de 1974, numa conferência de Imprensa, afirmou: “para além dos programas políticos, o que conta são as realidades humanas, e a realidade humana de Timor, que eu pude testemunhar e que os senhores também puderam testemunhar é que existe aqui muito vivo o sentimento de respeito e amor a Portugal. É um fenómeno sociológico que me parece que sai fora das regras normais da sociologia política”.
E Almeida Santos acrescentaria mais tarde que “os timorenses não querem ser descolonizados pela simples razão de que não se sentem colonizados”. Perante a hipótese de uma descolonização recebeu como resposta das forças-vivas de Timor “a nossa resposta ao problema da descolonização é que o que nós precisamos é de mais cultura, mais saúde, mais desenvolvimento agro-pecuário, mais tractores, mais comunicações e mais indústrias”
O desenvolvimento que teve lugar nos territórios onde grassara a guerra desde 1961, não se verificou em Timor. O pequeno território não foi objecto da cobiça dos imperialistas. Aos EUA agradava o seu actual estatuto e à URSS o seu potencial estratégico ou geo-estratégico não justificava o seu envolvimento, mesmo indirecto.
No acto de posse do novo Governador, ao tempo, Ten-Coronel Lemos Pires, o Ministro Almeida Santos afirmaria:
“Prepare-se V. Ex.ª para o mais espantoso fenómeno de dedicação a Portugal. Quando de lá regressei, rendido a essa heterodoxa sociologia de divinização da Bandeira Portuguesa, que venceu o tempo, a distância e o universalismo político, alguns me terão julgado possesso de romantismo caduco ou de heroicismo carlyleano. Não se trata disso. Apenas relatei, entre atónito e emocionado, factos que sem defesa possível emocionam e espantam”.
Esta era a atitude de Almeida Santos que correspondia à vontade dos timorenses, expressa não em votos, mas em actos e sentimentos. Mas Mário Soares, que de tudo sabe e jamais disse a qualquer questão “Não sei”, e “profundo conhecedor da realidade timorense”, reagiu negativamente à posição do seu lugar-tenente, acabando por afirmar: “É necessário convencer o mundo da intenção sincera de Portugal de abandonar as suas colónias. Manter diversos laços entre os territórios e a Metrópole conduziriam, a meu ver, a formas de neo-colonialismo larvar, que o governo português rejeita em bloco. Nós comprometemo-nos com um trabalho histórico”.
Esta posição do “patrão” da descolonização coloca em xeque a opinião de Almeida Santos que, com o seu grande à-vontade e discernimento, rapidamente faz agulha, acabando por afirmar: “Que independência está em dúvida? Nenhuma. Apenas a de Timor não tem ainda data. Mas tê-la-á em breve”.
Nada havia a fazer. O rei da descolonização não poderia hesitar pois, no fim, era o seu ego que estava em causa. Para subir ao mais alto pedestal na nova plêiade dos políticos portugueses, teria de começar por realizar algo que o imortalizasse e provasse à sociedade a sua enorme capacidade intelectual, cultural e, principalmente, a sede de poder. (…)
Assim, à semelhança do que viria a suceder em Angola e Moçambique, depois da independência, também Timor, depois da fuga de Lemos Pires e do seu Estado-Maior para a ilhota de Ataúro, acabaria por se envolver numa guerra civil com cerca de 60.000 mortos, que terminaria com a invasão da Indonésia, aprovada previamente pelos EUA…
O General Silva Cardoso, no citado livro recorda ainda que:
(…) antes do Ten-Coronel Lemos Pires e do seu grupo de colaboradores ter chegado a Timor, se deu a entrega da Guiné ao PAIGC, o que significou ser o autor moral do fuzilamento de milhares de guineenses; que o então Ministro dos Negócios Estrangeiros (Mário Soares) andou aos abraços a Samora Machel, quando os soldados das nossas FA continuavam a lutar e a morrer na província (Moçambique) em defesa das suas populações; (…)
Cor. Manuel Amaro Bernardo – Março de 2008
El País
Há 1 hora
7 comentários:
Comentário de José Pires no «Heróis do Mar»
Cabeça de Mário Soares servida numa bandeja
Mário Soares e Timor
Obrigado, senhor coronel Amaro Bernardo por mais esta achega que nos faz chegar. Não sou daqueles que pedem a cabeça de Mário Soares servida numa bandeja, como a de João Baptista entregue por Herodes a Salomé. Apenas que ponhamos o senhor no seu devido lugar, onde uma vaidade imensa, um orgulho desmedido e um auto-elogio sem freio alcandoraram a níveis quase divinatorios. Fez o o que fez, foi o que foi e já basta.
Aquelas coisas de que ele agora fala e escreve, como ainda ontem no DN - onde até acenava com um possível tribunal de Haia para os participantes na Cimeira da Lajes - mais não visa, parece, que Durão Barroso. Tudo porque aquele político português (mesmo depois de ter sido o anfitrião do que ele chama de a Cimeira da Vergonha e (ou) da Infâmia, na designação do seu bedel Batista Bastos), logrou obter a posição de Presidente da União Europeia, enquanto ele, inchado na sua inflacionada auto-importância, fez crer ao eleitorado português que chegaria facilmente a presidir ao Parlamento Europeu e depois viu o seu lugar ocupado por uma senhora francesa, à qual, por despeito e inveja que o fazem perder o verniz, ainda teceu epítetos menos elegantes. Ainda não esqueci a sua declaração feita perante as câmaras da TV de que não dormiria descansado se Cavaco Silva fosse para Belém. Se calhar é por isso mesmo, mais o vexame de ter levado uma sova de Manuel Alegre, que o deixou numa modesta posição, quase com Jerónimo de Sousa a morder-lhe os calcanhares que ele não perdoa. E também ainda não esqueci a sua lhaneza e demonstração de espírito democrático, quando da investidura de Cavaco Silva, ter saído pela esquerda-baixa do Parlamento, furtando-se ao cumprimento a que estava, pelas mais simples normas, obrigado a prestar. Se aquilo não foi um comportamento vergonhoso, não sei como o classificar.
Oiço muitas vezes amigos meus a recordar o seu combate pela Liberdade, quando das ameaças de nova ditadura do PC de Cunhal durante o PREC. Aí eu contraponho com o epíteto de bombeiro-pirómano, que primeiro causa os incêndios para depois ir zelosamente a correr ajudar a apagá-los.
Já se percebeu que não nutro por tal personagem simpatia nenhuma. Também não lhe guardo rancor algum. Mas estou muito mais longe ainda de lhe prestar a veneração que ele julga merecer. E com as atitudes que vem tomando, ainda menos, já se vê. Conto todo o apreço e admiração
José Pires
Caro amigo, passei para lhe desejar uma Páscoa Feliz, junto dos seus entes queridos... e das suas cadelinhas...
Abraços do Beezz
Depois de ler o artigo em causa e este comentário veio-me à lembrança umas declarações que Maria Barroso fez quando da sua visita a Timor como responsável da Cruz Vermelha Portuguesa em que a certa altura disse aos Timorenses que aí se encontravam algo como isto - Vocês devem estar muito gratos ao meu marido por tudo quanto ele fez por vós. Como se pode ser tão hipócrita!!!!
Caro Beezz,
Agradeço e retribuo os seus desejos e a atenção de se lembrar dos meus companheiros mais chagados!
Mas, para que alguém não diga que fujo à verdade, rectifico que uma das «cadelinhas» é cão. E, já agora a cadelinha velhinha e diabética, apesar da diabetes grave detectada há mais de 25 meses, vai aguentando devido às duas injecções diárias de insulina, cuja dose é ajustada aos resultados das análises frequentes à glicémia. Ontem foi reduzida ligeiramente devido a uma ameaça de hipoglicémia.
Abraço
A. João Soares
Anónimo,
Não há motivo para estranhar a hipocrisia nos políticos. Ela é frequente, não é raro afirmarem que na véspera não disseram isto ou aquilo, apesar das gravações pelos microfones da comunicação social.
Vejamos a importância transcendente dada à proibição dos piercings, como se fosse um caso capital para o desenvolvimento cultural, social, económico do País e da felicidade das pesoas, e logo a seguir recuarem. Também não devem ser esquecidos os recuos na lei do tabaco, nem a inoperância da lei de controlo das armas, de que não resultou a mínima redução da criminalidade violenta. Igual reflexão deve ser aplicada aos sucessivos agravamentos das coimas e multas do código das estradas, de que não resultou uma visível diminuição dos mortos em acidentes.
Hipocrisia não falta nos políticos e em quem os cerca.
A um político não se pode comprar um carro usado!!!
A. João Soares
Eu não percebo nada de política mas admiro quem perceba. E vejo que este blog aqui tem tudo para ensinar e trocar idéias.
Beijinhos
Querida Gisele Claudya,
É muita simpatia tua. Este blog não tem tudo. Não pode ter tudo. Mas tem alguns temas que merecem reflexão e sobre os quais vale a pena trocar ideias. O mal de um povo é viver apático, alheado dos grandes problemas que influenciam a sua vida. Em democracia, cada um tem o dever de votar, mas isso implica uma atenção permanente sobre a vida nacional, para poder decidir, em consciência, sem ser levado por falsas propagandas cheias de promessas irrealizáveis.
Um País só evolui se o seu povo estiver atento e colaborar para as grandes realizações.
Abraço para o Erik
Beijinhos para ti
João
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