segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Voto inútil

Transcrição de artigo seguira de NOTA:

Apologia do voto inútil
Público 2011.01.17 Gonçalo Portocarrero de Almada

O voto numa candidatura sem possibilidades reais de vitória ou a abstenção afiguram-se ser as opções mais coerentes

Em tempos de eleições presidenciais, legislativas ou autárquicas, é recorrente o recurso ao argumento do voto útil. Na gíria política, entende-se por voto útil a escolha do candidato ou do partido que, mesmo não reunindo as condições que o eleitor desejaria sufragar, é, no entanto, o menos mau dos candidatos com hipóteses de ganhar. Na perspectiva eleitoral, o voto num partido ou candidato que nunca poderá vencer é sempre um voto perdido ou, pior ainda, um voto nas candidaturas que ficariam beneficiadas com a inutilidade prática desse voto idealista.

À medida que se aproxima um acto eleitoral, esfumam-se os axiomas éticos e os princípios, que cedem o seu lugar à pressão das sondagens e das conveniências do momento, quase sempre apresentadas como inadiáveis exigências de salvação nacional. À conta desses pretensos imperativos de ordem pública, engolem-se não poucos sapos e conspícuos cavalheiros travestem-se ideologicamente, em malabarismos de rara acrobacia e discutível moralidade. E quem não se disponibilizar para uma tal cambalhota eleitoral e decidir não vender, nem hipotecar, o seu voto, é certo e sabido que pagará cara a factura da sua verticalidade: à partida é, pelo menos, um utópico e, à chegada do desastrado resultado eleitoral que a sua atitude propiciou, é um cúmplice do inimigo, um traidor.

É sabido que a história do voto útil tem barbas. Nas vésperas da Segunda Guerra Mundial, o voto útil funcionou a favor de duas grandes forças extremistas. Quando a Alemanha se encontrava numa muito delicada situação interna e externa, os nazis apareceram como a força mais eficaz para deter o triunfante bolchevismo, que ameaçava a liberdade alemã e europeia. É certo, em termos históricos, que muitos dos apoiantes de Hitler o fizeram à conta do voto útil: mesmo não concordando com as teses nazis, entenderam que essa era a única força política capaz de deter o comunismo internacional e, por isso, deram-lhe o seu voto. Em sentido contrário, o voto útil também funcionou a favor do bolchevismo que, para muitos antinazis, parecia ser o mal menor ou, pelo menos, a única estrutura partidária com força suficiente para se opor, com eficácia, ao nacional-socialismo. Mas é óbvio que tanto uns como os outros, quer votando de olhos fechados em Hitler, quer dando o seu contrariado voto aos seguidores de Estaline, favoreceram as respectivas tiranias e votaram contra a liberdade, a democracia e o bem comum. Os seus votos foram úteis, sem nenhuma dúvida, mas para o mal.

Não é só na vida privada que o crime não compensa, porque também na vida política essas leviandades pagam-se caras, como sabem os que sofreram a ditadura nazi na Alemanha, ou os que padeceram os horrores do comunismo na Rússia e nos outros países que também viveram, ou ainda vivem, sob a ditadura do proletariado. Na realidade, tanto os que sufragaram Hitler como os que apoiaram Estaline perderam, porque a vitória moral e política foi daqueles "inúteis" que souberam privilegiar uma atitude de coerência ética, sem se deixarem intimidar pelos falsos argumentos de uma suposta utilidade nacional ou internacional.

Se, por absurda hipótese, houvesse que escolher entre Estaline e Hitler, seria caso para dizer que venha o diabo e que escolha porque, por mais útil que fosse votar em Hitler, para que Estaline não pudesse ganhar, ou votar em Estaline, para que Hitler não saísse vencedor, seria sempre uma escolha dos diabos. E a quem o não seja, só lhe resta uma hipótese digna: não votar em nenhum dos dois, por mais inútil que uma tal atitude pudesse parecer.

Em Portugal, Hitler e Estaline não vão a votos, felizmente, e portanto é moralmente lícita a votação num candidato que, mesmo sendo defectível, é o menos mau dos possíveis ganhadores. Mas o voto numa candidatura sem possibilidades reais de vitória ou a abstenção, quando são escassas as garantias de idoneidade moral dos prováveis eleitos, afiguram-se ser as opções mais coerentes para quem, na sua vida pessoal e na sua actuação pública, não se pauta por conveniências contingentes, mas por princípios e valores permanentes.



Licenciado em Direito e doutorado em Filosofia. Vice-presidente da Confederação Nacional das Associações de Família (CNAF)


NOTA: Permita-me o douto autor acrescentar uma faceta do voto inútil que me parece mais significativa do que a abstenção. Enquanto esta dá uma má imagem do conjunto dos inscritos nos cadernos eleitorais, englobados como, comodistas, preguiçosos, indiferentes, apáticos, sem sentido de cidadania, omissos, etc. o VOTO EM BRANCO significa que o eleitor tem espírito de cidadão, patriota, vai às urnas deixar a mensagem : nenhum dos candidatos corresponde ao seu ideal de valores éticos, cívicos, patrióticos, com amor aos portugueses mais carentes. Não quer votar no menos mau. Só votará no bom, no perfeito, segundo a sua óptica.

Imagem da Net

4 comentários:

Pedro Coimbra disse...

Caro João,
Muito interessante, a entrevista que a filha de Fernando Nobre, Isabel Nobre, há dois meses a viver em Macau, concede hoje a um diário de Macau (http://pontofinalmacau.wordpress.com/) e à qual faço referância no meu blogue.
Um abraço

José Lopes disse...

Eu voto em branco exactamente porque não me revejo em nenhum dos candidatos, mas também acho que o sistema eleitoral não respeita devidamente os votos Brancos de quem não confia nos candidatos que se propõem aos lugares em causa em cada acto eleitoral.
Cumps

Paulo Lopes disse...

Caro amigo,

O "voto em branco", para mim, seria uma solução, caso houvesse maneira de meter uma cruz em "nenhum dos outros" e se pudessem tirar consequências do resultado dessa escolha. Não usarei o método de meter um papelinho virgem na urna, porque como sabemos, o sistema está viciado e as tentações serão muitas.

Gostava no entanto de saber se alguém confiável faz alguma verificação das pessoas que não votaram, ou se é possível que alguém vote em nome de alguém que não tenha ido votar.

Um amigo contou-me que a certa altura não quis ir votar e não foi, mas que no dia seguinte, ao cruzar-se com um dos membros do partido lá da terra, fez-lhe saber que havia votado por ele! Ora bolas! Afinal é possível votar em nome dos faltosos e nunca ninguém poderá verificar se a pessoa foi realmente votar.

Acredito que como este caso, haverá muitos mais.

Eu não vou votar, mas recomendo a quem se quiser dar ao trabalho, que anule o voto. No entanto, mesmo os votos nulos, poderá haver algum troglodita que na contagem os retira e mete um novo previamente preenchido.

É possível fazer tanta trafulhice, que se consegue compreender porque razão não existe ainda o voto electrónico, cujo software garantirá muito maior segurança.

Por Portugal!

A. João Soares disse...

Caros Amigos,

Não se pode esperar resultados do voto em branco na distribuição pelos candidatos. Não é essa a sua finalidade. Ele é uma alternativa à abstenção. Nas últimas legislativas houve mais votos em branco do que no partido mais votado que não conseguiu assento da AR e cerca de um quarto do partido vencedor.

As vigarices são sempre possíveis, mas não podemos crer que sejam generalizadas.

Neste momento há quem prefira optar por votar no candidato menos mau, usar o voto útil.

Os cavaquistas estão a ter consciência do esforço que está a ser feito para Cavaco obter menos de 50% dos votos válidos, a fim de ter de haver uma segunda volta onde ele perderá porque o seu rival (seja qual for) aglutinará todos os votos da esquerda. Não é por acaso que todos os candidatos conjugaram os ataques a Cavaco em coisas que, por vezes, nada têm a ver com as funções de PR. A politiquice está a arrastar-se pela lama, esquecendo os interesses de Portugal.

Perante isto, cabe a cada um de nós pensar naquilo que poderá ser menos lesivo dos interesses de PORTUGAL e usar o voto útil. Deve votar-se conforma a própria consciência mas sem prejudicar o País.

Abraços
João
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