Transcrição do artigo de Pedro Coimbra publicado no seu blogue Devaneios a Oriente que, pela serenidade e isenção com que está escrito, constitui um documento deste momento, útil para futura consulta.
Sondagens, previsões, e agora os resultados
Os resultados da eleições presidenciais em Portugal apresentam muito poucas surpresas.
Relativamente ao cenário que aqui tinha traçado na passada sexta-feira, os resultados já apurados confirmam, em grande medida, o que então previra.
Cavaco Silva foi reeleito à primeira volta.
Com uma votação, em percentagem, superior à que havia conseguido nas últimas eleições.
E superior também à votação com que Jorge Sampaio fora reeleito.
No entanto, os 52,91% que Cavaco Silva conseguiu, andam longe dos 60% que algumas sondagens lhe davam.
Ainda assim, são mais que suficientes para fazer de Cavaco Silva o grande vencedor da noite.
Não só por ter sido reeleito, não só pela percentagem de votos conseguidos (percentagem, notar bem, que o número de votos, 2 230 000, é o mais baixo de sempre), mas, principalmente, por ter ganho em todos os distritos do país.
Depois desta eleição, e desta votação, Cavaco Silva estará já a pensar que pode cumprir o seu sonho.
Que sempre foi, na realidade, cumprir o sonho de outro - Sá Carneiro.
Uma maioria, um governo, um presidente, será o próximo objectivo a alcançar.
E que, em boa verdade, nunca se apresentou tão verosímil.
Outro dos vencedores da noite foi Fernando Nobre.
Os 14,1%, correspondentes a quase seiscentos mil votos, constituem um resultado excelente para quem se apresentou longe dos aparelhos e das máquinas partidárias.
E dos apoios financeiros que as mesmas proporcionam.
No entanto, e embora reconhecendo o feito, confesso que ainda estava à espera de mais.
Os portugueses estão realmente fartos de politiquice e de politiqueiros.
E têm uma tendência natural para apoiar, por simpatia e empatia, quem se apresenta longe desse universo.
Esse traço de personalidade dos eleitores portugueses, aliado à personalidade afável, educada, altruísta, de Fernando Nobre, fizeram-me vaticinar um resultado ainda superior.
Ainda assim, sem dúvida uma votação expressiva a que conseguida pelo fundador da AMI.
Esperemos que não fique agora na ilusão que os seus seiscentos mil votos representam realmente o seu peso eleitoral.
E que, mais do que isso, representam algo mais que um mero resultado eleitoral de circunstância.
Outro dos grandes vencedores, e a grande surpresa, foi José Manuel Coelho.
O candidato vindo da Madeira, onde conseguiu quase 40% dos votos, e conseguiu fazer sombra a Cavaco, obteve um resultado verdadeiramente surpreendente.
Quase 190 000 votos, que correspondem a 4,5% dos votos expressos, dão a José Manuel Coelho o direito a reclamar vitória.
E a infernizar a vida a Alberto João Jardim, aquele que era o grande objectivo de José Manuel Coelho nestas eleições.
O fenómeno José Manuel Coelho só se explica também por ser uma voz incómoda, revoltada, por exprimir, ainda que de uma forma algo pueril, os sentimentos de muitos portugueses no momento difícil que se atravessa.
O voto em José Manuel Coelho é um voto de protesto contra esse momento difícil.
E a ausência de soluções credíveis.
Ao mesmo tempo que é também um voto divertido.
Salvas as devidas proporções, um fenómeno semelhante ao voto no palhaço Tiririca no Brasil.
No meio, o "empata" destas eleições, foi Francisco Lopes.
Quase 400 000 votos, 7,14%, confirmam as previsões das sondagens, excedem um pouco as minhas.
E, ao contrário do que afirmou Francisco Lopes, não representam "uma afirmação de revolta do nosso povo".
Representam antes a confirmação de um fenómeno que todos conhecemos há mais de trinta anos.
O eleitorado do PCP vota cegamente em quem o partido apresentar como candidato.
Nem que seja a Bota Botilde!!
Este seguidismo dos comunistas portugueses chega a ser confrangedor.
Mas nada surpreendente.
O grande derrotado da noite é, sem qualquer dúvida, Manuel Alegre.
Uma percentagem de votos inferior a 20%, uma votação inferior em quase 200 000 votos ao seu célebre milhão de votos.
Alegre foi, como Soares há cinco anos, vítima da sua ingenuidade e da sua sede de protagonismo.
Fraquezas aproveitadas com mestria maquiavélica por José Sócrtaes.
Embriagado com o milhão de votos conquistado nas últimas eleições presidenciais, então sem o apoio do PS, Manuel Alegre não percebeu que tinha conquistado essa votação precisamente por não ser apoiado pelo PS.
Como se este erro não fosse suficiente, a candidatura de Alegre apresentou um caldo de apoios que teve momentos de puro ridículo.
Ouvir Fernando Rosas dizer que Cavaco era o candidato do sistema, do arco da governação PS/PSD, num dos comícios de campanha de Manuel Alegre, dá cabo das esperanças ao mais carismático dos candidatos.
Juntar PS, Bloco de Esquerda e PCTP/MRPP, foi um erro crasso.
Que o PS de Sócrates soube cavalgar muito bem.
Os apoios do PS a Manuel Alegre foram quase envergonhados.
E assumiram, quase sempre, mais a forma de ataques a Cavaco Silva do que de apoios a Manuel Alegre.
Na estrada, e na hora da derrota, Alegre andou sozinho ou acompanhado pelos pesos-pesados do Bloco de Esquerda.
E por alguns socialistas pouco alinhados com a via socrática do partido.
Manuel Alegre termina aqui a sua carreira política.
Sem brilho, algo abandonado.
Fazendo lembrar os desportistas que arrastam as suas carreiras sem perceberem o momento ideal para as terminar em grande estilo.
No caso de Manuel Alegre, esse momento teria sido há cinco anos.
Outro dos grandes derrotados de ontem foi Defensor Moura.
Resultado de uma campanha deplorável, de ataques que variaram entre o reles e o patético (a evocação constante daquele episódio de um palco em Viana do Castelo é sintomática desse descontrolo), sem uma única ideia válida, Defensor Moura sai destas eleições vergado ao peso de uma derrota pesada (1,5%, correspondentes a 66 000 votos).
E com a imagem de ter sido o peão de brega que Sócrates usou para atacar Cavaco.
Grande destaque também para a brutal taxa de abstenção registada.
53,37%, mais de cinco milhões de eleitores, preferiram não votar.
Foram mais os abstencionistas que os votantes.
Sinal do afastamento dos portugueses em relação à política, de desilusão face às condições de vida que enfrentam, de enorme desinteresse ante as soluções(?) e alternativas(?) que lhes foram apresentadas.
Também de protesto face a uma campanha eleitoral pobre, feia, feita sobretudo de ataques e insultos.
Argumentos que valem igualmente para explicar os votos brancos e nulos que se registaram.
Por fim, o "perdedor mais vencedor" destas eleições - José Sócrates.
José Sócrates, derrotado porque é o secretário-geral do PS, que apoiou o candidato derrotado Manuel Alegre, paradoxalmente, conseguiu tudo o que queria nestas eleições.
"Arrumou" Manuel Alegre na prateleira onde já estavam colocados Mário Soares, Almeida Santos e os outros históricos do PS;
Atacou Cavaco Silva, através de Alegre, e, sobretudo, de Defensor Moura;
Envolveu-se ao mínimo na campanha, evitando assim chamuscar demasiado a sua imagem;
Antes de se juntar a Alegre na derrota, apareceu a falar ao país na sua total disponibilidade para continuar a cooperação estratégica com a presidência da República.
Sintomático.
Resta saber o que é que, verdadeiramente, pretende Cavaco fazer doravante.
À semelhança de Soares e Sampaio, no segundo mandato de ambos, Cavaco vai agora ser muito mais interventivo nos assuntos da governação do país.
Apertem os cintos que se aproxima turbulência!!
Imagem da Net
segunda-feira, 24 de janeiro de 2011
Presidenciais. Análise dos resultados
Publicada por A. João Soares à(s) 14:41
Etiquetas: eleições, presidenciais
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1 comentário:
Um abraço caro João
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