quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

O VAZIO ABSOLUTO

De:Pedro Rolo Duarte, Jornalista. pedro.roloduarte@gmail.com, DN de 070221

Leio na imprensa o "escândalo" envolvendo dinheiro e morte no mundo do jet set - a taróloga Maya esclarece numa entrevista que estamos apenas perante um episódio envolvendo uma "pessoa amiga de figuras do jet set". Em qualquer dos casos, há uma mulher em prisão preventiva pelo alegado envolvimento no assassínio do marido.
Parece-me "edificante" toda a história e a atenção que lhe está a ser dada - mas nada que se compare ao que terá sucedido na sexta-feira passada e o Correio da Manhã conta (sem desmentidos até à data): aquela espécie de homem chamada José Castelo Branco terá ido visitar a amiga detida. Mas "apareceu" em Tires fora da hora de visitas.

Pois bem, estão sentados? Tomem nota: Castelo Branco conseguiu entrar fora da hora regulamentar das visitas. Como se não bastasse, conversou com a suspeita fora do parlatório (local curricular para o efeito), numa sala particular. E, terceiro patamar vencido, pôde mesmo fotografar a senhora (parece que é verdade, dado que a fotografia saiu no jornal 24 Horas do dia seguinte).

Ou seja: alguém no estabelecimento prisional de Tires achou que a presença do senhor Castelo Branco justificava violar três regras essenciais do direito à igualdade de tratamento de um detido. A saber: horários de visitas, locais próprios de convívio entre detidos e visitantes e rigorosa proibição de fotografar, gravar ou filmar dentro de prisões.

É óbvio que a presença da figura em programas de TV como o Big Brother dos Famosos justifica, por si só, excepções à regra em tudo - eu já o vi a exigir jantar gratuitamente num evento para o qual não tinha sido convidado... -, mas não valia a pena dar da instituição prisional tão pobre, saloia e desgraçada imagem. É que eu consigo imaginar a cena: o desvario do visitante, a risota pegada dos guardas, e de repente a sequência dominó de violações regulamentares. Muitos pesos, muitas medidas, para pessoas que estão, teoricamente, em igualdade de circunstâncias.

Era risível, se não fosse grave. Era divertido, se não fosse tão triste. Era uma espécie de fait-divers, não se desse o caso de ser mesmo uma notícia.

Para rematar: a notícia veio no jornal. Não foi desmentida. Responsáveis, não há? Não se sabe - mas como "aos costumes dizemos nada", lá veio no dia seguinte a "breve" a anunciar um inquérito. Ou seja, a anunciar mais um vazio absoluto. O nada em que vivemos sempre.

NOTA: Dizia o Sr. Primeiro-Ministro em Novembro do ano passado, a propósito do passeio dos militares no Rossio, que a lei é igual para todos e que ninguém está acima da lei. Não estava a falar verdade, talvez por não estar informado daquilo que se passa dentro do rectângulo que governa. Este caso, provavelmente a somar a muitos outros, mostra bem que há muitos para quem a lei não tem o mínimo significado, nem pela sua compreensão nem pela dos próprios agentes da autoridade que fazem dela a interpretação que no momento mais lhes convém. É louvável que a amizade tenha levado este indivíduo a visitar a encarcerada das suas relações. Mas é condenável que os agentes da autoridade se tenham esquecido que a qualquer outro cidadão eram negadas as facilidades anti-regulamentares que lhe foram dadas indevidamente.
Ao que chegou este país que até pertence à UE ! Que vergonha!

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