O Infarmed no Porto trará vantagens para os portugueses?
(Publicado no semanário O DIABO em 26 de Dezembro de 2017)
Perante as considerações apresentadas nos artigos sobre a preparação de decisões publicados no DIABO em 27Set2016 e em 12Dez2017, surgem algumas dúvidas sobre se a decisão de transferir a sede do Infarmed para o Porto, foi suportada por estudo apropriado, atendendo aos interesses nacionais encarados por diferentes ópticas.
Os interesses nacionais (dos cidadãos) beneficiam da mudança do Infarmed de Lisboa para o Porto? De que forma? O Infarmed desempenhará no Porto as suas tarefas funcionais melhor do que se continuasse em Lisboa? O conceito de desconcentração dos serviços públicos assenta simplesmente em mudar os locais de trabalho da capital para outro ponto do território nacional? Que novas atribuições são dadas ao Infarmed, estando no Porto em vez de continuar em Lisboa? Quais os custos que derivam de a sede do Infarmed ficar no Porto enquanto alguns dos seus departamentos permanecerem em Lisboa? Como contabilizar os sacrifícios que os funcionários do Infarmed vão ter de suportar com a mudança? De que forma a mudança «vai contribuir para um desenvolvimento harmonioso do país»? Quais os factores tomados em conta quando se fala de tal desenvolvimento? Como se explica que será mesmo uma decisão "técnica e estrategicamente muito inteligente»? Como está a ser encarada a reprovação dos trabalhadores relativa a uma eventual transferência e como se faz face ao “risco da continuidade da missão do Infarmed”? Se o Infarmed for dividido com direcção no Porto e os serviços em Lisboa, como pode continuar a cumprir a missão se costuma haver reuniões diárias com muitos dos dirigentes, pois as propostas para decisão da tutela significam milhões de despesa do serviço nacional de saúde»? Como substituir os funcionários que foram demitidos por não quererem ir para o Porto? Serão convidados para os substituir elementos amigalhaços, ex-jotinhas, sem experiência nem grau académico? E como corresponder à colaboração bilateral com instituições afins estrangeiras e que, segundo consta, são fonte importante de financiamento em troca de serviços altamente qualificados prestados pelo Infarmed? Enfim as dúvidas são infindáveis e, por isso, exigem boa análise, estudo e avaliação antes de ser tomada decisão ponderada e realmente inteligente.
Como o PR disse, a desconcentração ou descentralização dos serviços deve concretizar-se com vista a beneficiar os cidadãos em geral e não para suportar caprichos de políticos. Um tipo de descentralização desejável seria a de conceder às autarquias ou serviços regionais competência e responsabilidade por forma a que algumas decisões de interesse local fossem tomadas com menos demoras, não precisando de esperar muito tempo pelo desenrolar de burocracias demasiado pesadas e, por vezes, sem visão perfeita das circunstâncias locais ou regionais.
Já, em tempos, houve um governo que fez a brincadeira de transferir uma secretaria de Estado para Portalegre, chamando a isso descentralização. O resultado foi nocivo por apenas trazer demoras e incómodos, de que é exemplo a maçada e a despesa de o Secretário de Estado ter de, frequentemente, se deslocar a Lisboa a despacho e reuniões com o ministro. E quantos assuntos terão sido retardados para evitar um deslocamento por tão pouca coisa. Entretanto, houve um acto de lucidez e compreenderam que descentralizar um serviço não se resume a mudar a sua sede. Deve ser a reestruturação das suas atribuições de forma a apoiar melhor as pessoas que beneficiam do funcionamento do serviço.
António João Soares
19 de dezembro de 2017
Almirante Gouveia e Melo (III)
Há 4 horas
3 comentários:
A trapalhada começa com a candidatura do Porto para receber a Agência do Medicamento, quem é que trabalhando em Londres, queria vir trabalhar para o Porto? Só de malucos, nem os gajos de Lisboa querem ir para o Porto, como é que quem trabalha na Europa quererá ir?
DESEJOS DE UM BOM ANO
INFARMED. Sobre a mudança para o Porto foi publicado no semanário DIABO, em 26/12/2017, um texto que expunha uma quantidade de dúvidas e de interrogações que eram destinadas à reflexão dos amigos do Governo escolhidos para estudarem o problema e elaborarem um relatório de preparação da decisão a tomar sobre o assunto, depois de aparentemente ter sido tomada a decisão, sem bases, sem estudos, sem reflexão, sem uso de metodologia parecida com aquilo que tenho aqui exposto repetidamente. https://domirante.blogspot.com/2017/12/mudanca-do-nfarmed-para-o-porto.html Mas, agora aparecem observações que demonstram novamente a ficção de decisões elaboradas sem inserção em qualquer estratégia com pés e cabeça. Por exemplo, em O DIABO de 24/7/2018, na pág 2, Marta Brito diz que foi «uma decisão autocrática do Terreiro do Paço», «em inquérito interno mais de 90% dos seus quadros tenham expressado claramente a sua rejeição à mudança», «O relatório encomendado pelo Executivo opta por ficar totalmente alheado do que é a vida real das pessoas e refere que os riscos “são negligenciáveis”», «o relatório entregue pelo grupo de trabalho não conseguiu provar qualquer vantagem com a deslocalização», «93% dos trabalhadores já disseram não estar disponíveis para ir trabalhar para o Porto», «a CT considera que “o relatório não é para ser levado a sério, e que pela qualidade que apresenta mais valia não ter sido feito”», «A presidente do Infarmed, Maria do Céu Machado, disse, numa audição no Parlamento, não entender os benefícios da deslocalização, alertando para perigos para a saúde pública e para os custos da perda de credibilidade do Infarmed e de Portugal.». Aquilo que aqui se transcreve mostra que as dúvidas e interrogações publicadas em 26/12/2017 estavam correctas, eram positivas, construtivas e pretendiam ser úteis para a preparação de decisão sobre o assunto.
O política não merece confiança, por os seus agentes tomarem decisões e fazerem promessas sem as prepararem devidamente
Depois suspendem. Veja-se o artigo seguinte:
Promete agora, suspende depois
https://observador.pt/opiniao/promete-agora-suspende-depois/
24/9/2018, 0:09 Por Alexandre Homem Cristo
Nos dossiers Infarmed e descongelamento da carreira dos professores, o governo seguiu um mesmo caminho: prometeu por conveniência, avaliou o impacto, e por fim suspendeu, dando o dito por não dito.
Poucos episódios serão mais elucidativos acerca do processo de decisão do actual governo do que o da deslocalização (agora falhada) do Infarmed para o Porto. O governo não estudou a viabilidade da medida, mas decidiu. O governo não sabia explicar a medida, mas informou. O governo disse ter decidido há muito tempo, mas ninguém sabia (nem o ministro). O governo não consultou sequer a direcção do Infarmed, mas avançou. O governo ouviu as queixas, mas garantiu serenidade. Milhares aplaudiram, mas ninguém entendeu a viabilidade da medida. O governo estabeleceu prazos, mas depois suspendeu. O governo adiou, mas depois entregou o ónus do fracasso a comissões parlamentares. Eis uma mistura explosiva de propaganda aliada a incompetência.
Começou por ser uma “intenção” anunciada pelo ministro da Saúde, uma ideia dita bem-intencionada: transferir o Infarmed de Lisboa para o Porto, em linha com a aposta de candidatar a cidade a receber a Agência Europeia do Medicamento (EMA). Só que a “intenção” era afinal uma “decisão” cujo único problema, garantiu António Costa, foi a “inabilidade” da sua comunicação. Segundo o primeiro-ministro, nem sequer havia novidade, pois a transferência do Infarmed para o Porto estava decidida há muito tempo – muito antes sequer de se ponderar a candidatura à EMA. Podia-se então perguntar por detalhes ao ministro da Saúde? Não, que ele não sabia responder a nada. Mas a decisão era tão firme que António Costa a repetiu sucessivamente: cinco vezes afirmouque essa era a “decisão do governo”. Curiosamente, ninguém estava informado dessa decisão tomada há tanto tempo. Não sabia a direcção do Infarmed – avisada, com um telefonema do ministro da Saúde, minutos antes de a notícia se espalhar. Não sabiam os funcionários do Infarmed – que se opuseram em bloco à transferência. E não sabia o omnisciente Marcelo – que, explicou-se, afinal também não tinha de saber.
Como revela a sequência, o problema mais evidente foi semprea falta de estudo e avaliação do impacto da transferência do Infarmed. Agora que a avaliação foi efectuada, as conclusões colidem com as intenções e decisões. Resultado: o ministro da Saúde suspendeu o processo e remeteu o dossier à comissão parlamentar da avaliação da descentralização dos serviços públicos. Traduzindo: tirou-o das suas mãos, para que morra definitivamente nas mãos de outros.
O fracasso deste processo de transferência do Infarmed é um daqueles desfechos mais do que previsíveis, mas que ajudam a compreender os processos de decisão do governo nos dossiers mais sensíveis, isto é, naqueles em que é necessário conciliar vários interesses políticos. Não, o ponto não está nas contradições e incoerências que, em breve, serão alvo de versões actualizadas. O ponto está na constatação do vazio em que se tomam decisões políticas, com efeitos profundos na estabilidade de instituições, sectores e cidadãos. O ponto é a ausência de avaliações, estudos ou consultas a especialistas. O ponto é que decisões sobre instituições-chave sejam tomadas sem se consultarem as próprias instituições. O ponto é a submissão das políticas públicas à vontade e à conveniência dos acordos políticos dos socialistas. O ponto é a inexistência de responsabilização política quando é inegável a incompetência da liderança dos dossiers, com prejuízo claro para os sectores tutelados. O ponto é a propaganda, que confunde o debate e dilui o fundamental, em nome da defesa do poder...
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